Sunday, April 28, 2019

O conceito do Círculo de Competência





“Eu não sou um gênio. Em sou esperto em algumas áreas—e eu me mantenho nessas áreas.” — Tom Watson Sr., Fundador da IBM

No início dos anos 90 um sujeito chamado Paulo Roberto de Andrade achou que seria uma boa idéia transformar o processo de engorda de bois em um produto financeiro. A promessa era de rentabilidades acima de 40% em 18 meses e portanto não faltou gente vendendo o produto no mercado. A propaganda era boa! Quando o Antonio Fagundes não estava fazendo o Bruno Mezenga na novela, ele estava recomendando o investimento nos comerciais. Que a novela se chamasse Rei do Gado tornava tudo ainda mais mágico. E que o processo normal de engorda de bois rendesse, historicamente, algo como 10% em 18 meses era um detalhe de pouca significância. Afinal, todo mundo conhecia alguém ficando rico com o esquema das Fazendas Reunidas Boi Gordo. Advogados, médicos, engenheiros e todo o tipo de gente que nunca viu um boi na vida, correram para investir e ver suas economias de vida se multiplicando. No final, 30 mil investidores perderam quase 4 bilhões de reais naquela que é uma das maiores pirâmides financeiras da história do país.

Existem algumas razões pelas quais uma pessoa cai nesse tipo de armadilha e uma delas é o tema desse post: ignorar seu círculo de competência! Círculo de competência é a área que corresponde aos seus conhecimentos, habilidades e expertise. Em outras palavras, círculo de competência é aquilo que você sabe! Enquanto os números fantasiosos das Fazendas Reunidas Boi Gordo saltariam a vista de um pecuarista, eles não seriam tão óbvios para um dentista.  No entanto, o dentista teria grande vantagem ao avaliar uma empresa como a Odontoprev.

Toda vez que o investidor se aventura no desconhecido, ele está saindo do seu círculo de competência. Pode ser ótimo em caráter exploratório mas é potencialmente devastador para o investidor. Em sua carta de 1996, Warren Buffett escreveu o seguinte:

“O que o investidor precisa é da habilidade de avaliar corretamente determinados negócios. Atenção na palavra “determinados”: Você não precisa ser um especialista em todas as empresas, nem mesmo em muitas. Você só precisa ser capaz de avaliar as empresas no seu círculo de competência. O tamanho desse círculo não é muito importante; conhecer o seu limite, no entanto, é vital”

Buffett se manteve fiel ao seu príncipio mesmo diante das pesadas críticas sofridas no fim da década de 90. Alegando não entender de empresas de tecnologia, Buffett se recusou a participar do boom das empresas de internet. A medida que os preços das empresas de tecnologia iam subindo em disparada, os resultados de inúmeros gestores também iam subindo e, consequentemente, a performance de Buffett ia ficando pra trás. Dizer que Buffett estava obsoleto e acabado tinha virado tema comum. Até que explodiu a bolha do Dotcom e Buffett renasceu das cinzas.

O fato é que Buffett nunca disse que as empresas de tecnologia eram ruins. Ele apenas soube reconhecer sua limitação em avalia-las, o que é bem diferente. E entender as próprias limitações é uma qualidade importante na vida do investidor. Alguém poderia dizer que por se manter em seu círculo de competência Buffett também deixou de ganhar muito dinheiro. Como, por exemplo, ao se recusar a investir na Microsoft apesar de ser amigo pessoal de Bill Gates há decadas. Sobre isso, Buffett é bem claro:

Os erros são cometidos quando existem negócios que você entende e que são atraentes e você não faz nada em relação a isso. Eu não dou a mínima para situações que aparecem como quando eu conheci Bill Gates e não comprei Microsoft.”

A mensagem de Buffett é direta: em seu processo de investimento não cabem negócios que ele não entende. Não importa se o negócio é indicado pelo dono, se é promovido por publicitários, se é a última moda ou se muita gente está ganhando dinheiro com ele: sem um entendimento não há investimento. Por que ele faz isso? Porque as chances de se cometer um erro são maiores quando se sai do seu círculo de competência.

Qualquer pessoa de bom senso há de concordar que é mais fácil perder dinheiro em um negócio que se conhece pouco do que em um negócio que se conhece muito. Então por que alguém iria se expor a investir fora do seu círculo de competência? Basicamente por modelos mentais disfuncionais. Alguns dos mais comuns são:

  1. Tendência de superestimar as próprias habilidades. Acontece quando o investidor acredita que seu círculo de competência é maior do que realmente é, fato muito corriqueiro entre pessoas extremamente inteligentes. Essa é a razão pela qual Buffett mencionou que conhecer os limites do seu círculo de competência é vital.
  2. Inveja ou, em outras palavras, não querer ficar pra trás do vizinho. O investidor deveria ocupar seu tempo em desenvolver seu processo e ir dormir cada dia um pouco melhor do que quando acordou. A corrida que o investidor deve travar é sempre contra ele mesmo. Na prática, contudo, não é assim que acontece. Investidores costumam ter natureza competitiva e por isso nutrem obsessão pelo desempenho dos seus pares. E quando todos os seus pares estão ganhando dinheiro com o desconhecido, a tentação é grande de segui-los.
  3. Tendência a hiperatividade. Incapazes de encontrar oportunidades dentro do círculo de competência, investidores se vêem na necessidade de navegar em mares desconhecidos. A melhor solução nesses casos é simplesmente não fazer nada. Como disse Pascal, “a maior parte dos problemas do homem decorre da sua incapacidade de ficar sozinho e quieto em um quarto.”

A boa notícia é que é possível expandir seu círculo de competência. Como todo processo que é bem feito, exige dedicação, tempo e paciência. Ninguém vira especialista em uma nova indústria do dia pra noite. Mas aos poucos é possível construir uma nova base de conhecimento. Por isso a vida do investidor deve ser o de constante aprendizado. E é por isso que o investidor que vive uma vida de estudos amplia cada vez mais a sua vantagem com o passar dos anos. Essa é a verdadeira vantagem da experiência. A experiência que vem da velhice, sem um refinamento do processo de investimento, não significa nada. Não importa o quão bem sucedido você já é, sempre existe alguma coisa pra aprender. As vezes é um ativo, uma indústria, um tipo de gestor ou um novo país.

Resumindo, o que fica desse post é o seguinte:

  1. Seja honesto consigo mesmo e defina o seu círculo de competência
  2. Opere apenas dentro dos limites do seu círculo de competência
  3. Trabalhe para ampliar o seu círculo de competência ao longo do tempo


Esse blog, assim como meu novo twitter, é pra mim uma oportunidade de expandir meu círculo de competência. Com eles eu sigo aprendendo com grandes pessoas um pouco mais sobre as indústrias e empresas brasileiras. Espero que também possa ajudá-lo(a).

Stay cool,
Don Black

Tuesday, April 23, 2019

Centauro, uma empresa ascendente ou o conto do cavalo manco?




A Centauro é a maior varejista de produtos esportivos do Brasil com 192 lojas distribuidas em 23 dos 26 estados brasileiros, sendo a maior parte delas localizada em grandes shoppings do país. A história da empresa começou há 38 anos atrás quando seu fundador, Sebastião Bomfim, abriu a primeira loja em Belo Horizonte. Depois de uma longa expansão feita ao longo dos anos, Bomfim resolveu vender parte da empresa para a GP Investimentos em 2012, quando a marca já tinha 233 lojas. Dentro dos limites impostos por um relacionamento conturbado com o fundador, a GP fez aquilo que ela faz: fechou algumas lojas, cortou custos e preparou uma saida via IPO. Depois de algumas tentativas frustradas, o IPO finalmente saiu na semana passada, nos dando a oportunidade de falar sobre a empresa.

INDÚSTRIA


Apesar de possuir uma linha de marca própria, a Centauro é essencialmente uma revendedora de artigos esportivos das principais marcas como Adidas, Nike e Under Armour. De forma geral, a vida de uma revendedora não é muito fácil já que sua marca não tem muito valor para o consumidor. Quando o cliente vai comprar um tênis, ele quer saber se é Nike mas não quer saber se veio da Centauro ou da Netshoes. Como todos os tênis daquele modelo vão ser iguais, o foco do cliente vai estar no preço e nas condições de pagamento. Quando isso acontece, pode ter certeza que você está diante de uma indústria de margens baixas.

As empresas têm diferentes formas de lidar com essa realidade. Um caminho é tentar ser um operador low cost (baixo custo) e repassar todo o corte de custo para os clientes. Além de ter uma operação enxuta, o operador low cost tem que buscar reduzir seus custos de aquisição dos produtos. No caso da Centauro, é importante conseguir vantagens junto às fabricantes de materiais esportivos. As vantagens poderiam vir de melhores condições de pagamento, menores preços ou exclusividade nas linhas dos produtos. O problema é que as vendedoras de artigos esportivos não tem muito poder de barganha sobre os fabricantes. Não só os fabricantes são grandes empresas multinacionais com condições de distribuir seus próprios produtos,  como o mercado de artigos esportivos é muito fragmentado. A Centauro, apesar de líder do mercado, possui apenas 5% do market share.

Uma outra forma de lidar com essa realidade é buscar um posicionamento mais sofisticado. Sim, os produtos serão os mesmos mas a experiência da compra será diferenciada. A empresa vai oferecer para seus clientes uma loja de alto padrão com um atendimento personalizado para a compra daquele tênis que ele procura. A aposta é que o serviço superior vai compensar uma eventual diferença de preço. Esse parece ser o caminho escolhido pela Centauro.

ESTRATÉGIA

Atualmente, além das tradicionais lojas físicas, a Centauro trabalha com duas frentes de desenvolvimento:
  • Plataforma digital, para acompanhar a tendência do crescimento do varejo online brasileiro. 
  • Criação das chamadas lojas G5, lojas físicas que proporcionam uma experiência imersiva para os clientes

No interseção dessas duas frentes está a implementação da estratégia omnichannel, que seria uma integração entre lojas físicas e plataformas digitais.

Primeiro as Lojas G5:

Este vídeo mostra um pouco do que é essa loja da nova geração: https://www.youtube.com/watch?v=GrpY04O9b2Y

A idéia parece ser melhorar a experiência do cliente, incorporando novas tecnologias nas suas lojas físicas. Dentre as novidades estão um provador inteligente e a possibilidade de testar um tênis de corrida em uma esteira com simulador. Por enquanto existem apenas 16 lojas G5 mas a empresa quer seguir fazendo essa conversão nas suas lojas. Por mais interessante que possa ser esse conceito, o que me interessa é saber o quanto de retorno incremental essa nova loja proporcionou em relação ao capital que foi investido nesse processo de remodelagem e desenvolvimento. Eu não encontrei essa informação mas, caso você tenha encontrado, sinta-se a vontade para dividi-la.

Agora com a Plataforma Digital:

Não há dúvidas de que o comércio online trouxe um componente disruptivo para o varejo. O comércio eletrônico possibilita operações de menor custo já que o vendedor não precisa se preocupar em montar uma loja em um shopping de grande circulação, por exemplo. Como foi dito lá em cima, com um menor custo de operação o vendedor pode repassar a economia para os consumidores e ganhar clientes por estar vendendo os mesmos produtos que as lojas físicas vendem, mas com um preço menor.

No entanto existem algumas peculiaridades, já que nem todos os produtos “viajam” tão bem para o comércio da plataforma digital. Vamos pensar na diferença entre um livro e uma verdura. Enquanto o livro é um produto bem padronizado, as verduras não são. Se você quer o livro do “Investidor Inteligente” - e você deveria - você pode comprar na livraria ou no site com a certeza do que está levando. Mas se você quer comprar uma alface é de se esperar que você queira ver qual alface você está comprando. A questão para a Centauro é saber em que ponto dessa linha estão os artigos esportivos.

Eu acho que dois fatores ainda protegem a Centauro no curto prazo: o primeiro é que boa parte dos artigos esportivos são personalizados e, portanto, agregam valor à loja física. Um exemplo é a pessoa que quer comprar uma chuteira mas quer ter certeza de que o modelo que ela vai escolher fica confortável nos seus pés. O segundo é que o mercado brasileiro como um todo ainda valoriza a loja física, não tendo migrado em massa para as plataformas digitais. Acredito que os dois casos são uma proteção de curto prazo que serão eliminadas aos poucos no longo prazo. O crescimento das vendas online tem se mostrado uma tendência que eu, particularmente, jamais apostaria contra.

A Centauro, se por um lado segue na sua alta aposta em grandes lojas físicas, por outro não quer ficar de fora da festa. Por isso oferece de tudo um pouco no espaço digital: comércio próprio em site, celular e aplicativo, além de um marketplace para venda de produtos de terceiros e também a integração entre lojas físicas e virtuais pela plataforma omnichannel. Considerando o número de lojas que a Centauro possui, o baixo custo de desenvolvimento de soluções digitais e a tendência de crescimento no mercado de vendas online, era de se esperar que a empresa fizesse mesmo uma entrada no e-commerce. Se é o suficiente para fazer a Centauro prosperar já são outros quinhentos. O próprio crescimento das vendas online da Centauro pode canibalizar as vendas físicas, tornando a empresa menos lucrativa. Afinal, loja de 1.000m2 em shopping center para centro de distribuição de venda online é como matar formiga com bazuca.

TENDÊNCIA FINANCEIRA



É muito claro que estamos diante de um clássico caso de recuperação de uma empresa grande e ineficiente. Apesar da pouca evolução no top-line, com receitas e lojas praticamente estáveis em quatro anos de operação, houve uma considerável melhora no bottom-line. A melhora dos números operacionais com redução do endividamento são resultado de um plano de eliminação de lojas deficitárias (o que também refletiu na queda da receita líquida), renegociação de contratos de locação e enxugamento de custos como um todo. Ou seja: um claro sinal da mão da GP Investimentos.

A GP entrou na Centauro em 2012 e só temos ai os números a partir de 2015. Seria interessante ver esses números um pouco pra trás, não só desde 2012 mas também desde antes da entrada da GP, porque daria uma visão do que é a empresa sob a batuta do seu fundador e também de eventuais conflitos entre Bomfim e GP a partir de 2012. Meu palpite é que a empresa veio gorda até 2015 mesmo, o que deve ter dado uma boa dose de dor de cabeça para o pessoal da GP.


VALUATION & CONSIDERAÇÕES FINAIS

Eu vejo com ressalvas uma evolução operacional de curtíssimo prazo que acontece lado a lado com sucessivas tentativas de IPO em uma empresa dividida entre seu fundador e um private equity. Me lembra a estória do dono de cavalo que, chegando no veterinário, falou “Veja se você pode me ajudar, meu cavalo corre mais do que todos os outros mas o problema é que de vez em quando ele manca”. No que o veterinário imediatamente respondeu “Pois então o senhor fique tranquilo, quando o seu cavalo não estiver mancando é só vende-lo”.

Eu prefiro esperar mais um pouco pra ver se esse negócio, meio homem e meio cavalo, vai mancar ou não. Honestamente eu teria ficado muito mais impressionado se tivesse a convicção de que essas melhorias operacionais vieram pelas mãos do fundador e não pela influência de um private equity que já carrega o negócio há sete anos. Além disso, a destinação dos recursos do IPO vão, segundo a companhia, para um crescimento que, na minha opinião, poderia ser obtido organicamente sem IPO se os recentes resultados financeiros se mantiverem. Mas nem sempre o IPO existe pelo que o prospecto diz ser a destinação dos recursos do IPO.

Dito isso, também não tenho confiança na capacidade de crescimento sem destruição de valor da Centauro. A empresa em si já em grande, com ampla presença no país e sem maiores proteções. Em relação ao seu preço, a Centauro veio a público por R$ 12.50 e já está em R$ 11.93, em uma queda que caminha para 5%. Seguindo a lógica de todo IPO e considerando a já discutida realidade da empresa, eu não acho que os atuais níveis de preços refletem uma boa oportunidade. Uma boa oportunidade deve ter, por definição, boa margem de segurança. E eu simplesmente não vejo isso na Centauro.


Para frente eu vou ficar de olho no crescimento top-line, geração de valor a partir da aplicação dos recursos, evolução do fluxo de caixa e relacionamento GP/Bomfim na condução da empresa. Além do preço, óbvio!

Stay cool,
Don Black

Sunday, April 21, 2019

A psicologia da riqueza

Grace Groner nasceu em uma pequena cidade a pouco menos de uma hora de Chicago. Aos 12 anos ela ficou orfã e passou a ser criada por uma família da comunidade onde vivia. Era ano de 1935 quando Grace, aos 25 anos, conseguiu um emprego como secretária na farmacêutica Abbott. Neste emprego ela permaneceu pelos próximos 43 anos, quando finalmente se aposentou. Como muitas pessoas que viveram a Grande Depressão, Grace era uma pessoa simples. Vivia em uma pequena residência, comprava roupas de segunda mão e não tinha carro. Morreu em 2010 aos 100 anos, tendo deixado um montante de 7.2 milhões de dólares para a universidade onde se formou, Lake Forest College. Sua intenção era que sua doação fosse usada em um programa de bolsas para que pessoas humildes pudessem estudar. Para quem se interessar, a Fundação Grace Elizabeth Groner na Lake Forest College existe até hoje**.

A primeira pergunta que vem a mente é como Grace conseguiu acumular tanto dinheiro. Não, não foi herança.  Quando começou a trabalhar na Abbott, Grace comprou três ações da empresa. Comprou, nunca mais vendeu e reinvestiu os dividendos. Grace viveu o fim da Grande Depressão, a Segunda Guerra Mundial, a Guerra da Coréia, a Guerra do Vietnã, a Guerra do Iraque, a Guerra do Afeganistão, a super inflação americana dos anos 70, três bear markets e treze recessões. E nunca vendeu NENHUMA ação! Para a felicidade de Grace, as ações que ela manteve por mais de 70 anos se valorizaram a uma taxa anualizada de mais de 15%. Sim, Grace também teve sorte.

Ainda em 2010, pouco tempo depois de Grace deixar uma fortuna para a caridade, um sujeito chamado Richard Fuscone admitiu para o juíz que estava completamente falido: "Eu fui devastado pela crise financeira... Minha única fonte de liquidez é aquilo que minha mulher conseguir vender do mobiliário que ainda nos resta". Entre outras coisas, Fuscone alegou não possuir nenhuma fonte de renda. Tudo para evitar que sua mansão de quase 2.000 metros quadrados avaliada em mais de 10 milhões de dólares fosse tomada pelos credores.

Enquanto Grace teve sua educação na modesta Lake Forest College, Fuscone passou pela Harvard Business School e pela Universidade de Chicago. Fuscone chegou a ser vice chairman da divisão LatAm da Merrill Lynch e teve uma carreira tão meteórica na indústria de investimentos que se aposentou aos 40 anos para "buscar seus interesses pessoais e filantrópicos". E lá estava Fuscone, lutando para manter sua casa de dois elevadores e duas piscinas.

Eu não quero usar esse espaço para comparar as estratégias financeiras de Grace e Fuscone. Eu sequer sei o bastante sobre as estratégias do Fuscone (exceto que ele se alavancava, coisa que eu não faço). Quero só observar a relação que diferentes pessoas tem com o dinheiro. É óbvio que Grace estava satisfeita com a vida dela. Talvez ela não pudesse comprar a mansão do Fuscone, mas ela podia comprar muito além daquilo que ela tinha. E se ela não o fazia, é porque estava feliz do jeito que estava. Por outro lado, por alguma razão que eu desconheço, Fuscone fazia questão de uma casa com 11 banheiros...

A primeira vez que pensei sobre esse assunto foi há anos atrás, no meu primeiro e último emprego. Já era quase madrugada quando meu chefe se levantou pra ir embora e perguntou o que de tão urgente eu estava fazendo para ainda estar ali. A verdade é que eu não estava fazendo nada urgente. Eu estava apenas absorvido em uma análise. Quando ele soube, sua resposta foi: "Então vai embora logo. Você não vai ganhar mais por isso mesmo". Acontece que eu também não estava fazendo aquilo para ganhar mais e, achando que ele entenderia, fiz questão de explicar. Foi quando ele me disse que, nesse caso, eu estava no lugar errado. E estava. Passei uma semana pensando nisso e, então, pedi demissão. Ele foi honesto, eu fui honesto. Bom para todo mundo.

Que isso tenha acontecido cedo na minha carreira foi uma grande felicidade. Desde então eu sigo minha vida como investidor. Desde então eu não invisto por dinheiro e, talvez por isso, tenha sido tão lucrativo. É apenas o que eu gosto de fazer. Eu gosto de revirar as pedras, procurar as empresas e encontrar uma que me pareça boa. Eu gosto ainda mais quando vejo uma dessas empresas prosperando com uma grande execução. Eu gosto de aperfeiçoar o meu método. E eu gosto das amizades que essa filosofia me trouxe: gente que, coincidentemente ou não, são mais Grace e menos Fuscone. O reconhecimento da minha relação com o dinheiro foi o que me trouxe riqueza ao me colocar no lugar certo: um lugar onde faço o que gosto, da maneira que gosto, me relacionando com gente que gosto.

E você? Qual é a sua relação com o dinheiro? Qual é a sua riqueza?

Stay cool,
Don Black

* Esse texto tem como inspiração parte do texto do brilhante Morgan Housel. Leia a íntegra: https://www.collaborativefund.com/blog/the-psychology-of-money/

** Site da fundação Grace Elizabeth Groner: https://www.lakeforest.edu/offices/groner/

Wednesday, April 17, 2019

Diversificação e diversidade

Hoje eu acompanhei no Twitter um debate sobre diversificação. O debate sobre diversificação, como boa parte dos debates de redes sociais, é cheio de opiniões extremas. Pessoalmente eu não diversifico muito, fato este que tem me servido bem ao longo dos anos. Mas se perguntado se esse é o certo, minha resposta vai ser um genérico e insatisfatório “depende”. Do que? Do investidor. Vamos a um breve fato da minha vida pra me ajudar com a minha explicação...

Eu gosto do Rowan Atkinson, ator do lendário Mr. Bean. Eu olho para a cara dele e já tenho vontade de rir. Aqui na Inglaterra ele é um dos mais respeitados artistas. Mas em um mundo sem unanimidades, é de se esperar que há quem não goste dele. Meu pai era um desses. Me lembro até hoje que, quando eu era criança, o Mr. Bean tinha um pequeno espaço no programa do Fantástico. E todo domingo o processo era mais ou menos o mesmo: eu esperava ansioso pelo Mr. Bean e, quando ele aparecia na TV, meu pai mudava de canal. Nada que me impedisse de tentar de novo na semana seguinte...

Eu e meu pai divergíamos também sobre um outro ícone: Sylvester Stallone. Eu ficava maravilhado com o Stallone liquidando todos que cruzavam o seu caminho. Podia ser como Rambo ou podia ser como Rocky: lá estava ele passando por cima de todos. E sempre seguindo seu código de honra. Eu achava fantástico! Meu pai achava que tanto o Stallone quanto o Atkinson eram meio idiotas, o que me causava certa apreensão sobre o que ele pensava de mim.

De qualquer forma, por mais que eu goste dos dois, não consigo imaginar o Atkinson fazendo o Rocky e o Stallone interpretando o Mr. Bean. Acho que seria um retumbante fracasso ver o Atkinson carregando peso na neve para lutar boxe contra o Drago. Só de cogitar eu já acho hilário, o que certamente não é a intenção do filme.

Mas de uma forma ou de outra existe o Atkinson e existe o Stallone, e os dois são bem sucedidos. Isso por que o entretenimento tem espaço para o humor e para a ação. E mesmo um cara como o meu pai não tem do que reclamar já que artistas como George Carlin e Clint Eastwood, seus favoritos, também encontraram o caminho da glória.

O mundo do investimento também aceita a diversidade, ainda que esse seja um fato que muitos relutem em aceitar. Alguns operam derivativos, outros não. Alguns diversificam, outros não. Alguns giram muito as posições, outros não. E em todas as situações existem os casos de sucesso e os de fracasso. Buffett, Druckenmiller, Chanos, Soros, Ackman, Andreessen, Bogle, Simons... De alguma forma são todos fantásticos investidores que prosperaram através de diferentes estratégias. E talvez se um tivesse usado a estratégia do outro, nenhum tivesse vingado. Assim como acho que o Atkinson (Mr. Bean) não teria vingado como Rocky Balboa.

O que dá o tom do sucesso é o esforço consistente sobre situações onde as chances estão a seu favor. Por isso falo sempre da importância de o investidor descobrir o processo que funciona para ele. Se matemática não é o seu forte, quant certamente é um péssimo caminho a seguir. E quanto antes você reconhecer e aceitar isso, melhor para você. Saber o que não fazer é tão importante quanto saber o que fazer.

Como disse Sócrates, “Conhece-te a ti mesmo”. Busque conhecer suas características e descobrir onde você terá vantagem sobre o mercado. Encontre sua vantagem competitiva. E só então, a partir dai, comece a construir o seu processo de investimento.

Stay cool,
Don Black


Monday, April 15, 2019

O conceito de Moat



Moat é um dos mais poderosos conceitos em investimentos e foi inventado por ninguém menos do que Warren Buffett. Na tradução literal moat significa fosso e o seu significado econômico vem de uma inspiração medieval onde Buffett faz uma analogia entre um business e um castelo que deve ser defendido.

Segundo Buffett, se você tem um castelo, é de se esperar que outras pessoas virão tentar tomá-lo de você. E quanto mais bonito ele for, maior será a dedicação dessas pessoas para tomar esse castelo. Elas vão tentar de tudo, te atacando por todos os lados e usando todos os recursos que elas tiverem. Então você tem que buscar maneiras de proteger o seu castelo e, no caso, você vai querer o maior fosso possível. Você vai querer um fosso largo e profundo, cheio de jacarés e o que mais você puder colocar lá para proteger o seu castelo.

No mundo dos negócios é bem por ai que as coisas funcionam. Se você tem um negócio muito lucrativo, é certo que outras empresas vão buscar uma maneira de pegar uma fatia desse seu lucro. Elas não vão simplesmente ficar paradas vendo seu negócio ficar mais próspero a cada dia. Então é importante que você consiga proteger esse negócio dos seus concorrentes. E a maneira de você fazer isso é construindo um grande fosso ao redor do seu castelo. Seu negócio precisa de um moat!

Com a palavra, o mestre:

"Então nós pensamos em termos desse moat (fosso) e da impossibilidade de cruzá-lo como o critério principal de um grande negócio. E nós falamos para nossos gestores que nós queremos que o moat fique mais largo todo ano. Isso não quer dizer necessariamente que o lucro vai ser maior esse ano do que no anterior porque ás vezes ele não vai ser mesmo. No entanto, se o moat ficar mais largo a cada ano, o business vai se sair bem. Quando nós vemos um moat que é frágil de alguma maneira, então simplesmente é muito arriscado. Nós não sabemos como avaliar isso. E, então, nós deixamos pra lá. Nós acreditamos que todos os nossos negócios - ou virtualmente todos os nossos negócios - tem excelentes moats" - Warren Buffett durante reunião anual da Berkshire Hathaway em 2000

Moat também é um conceito muito debatido no espaço acadêmico. Michael Porter, professor da Harvard Business School, já há muito tempo estuda o impacto das forças competitivas na estratégia de uma empresa. Porter usa o termo "vantagem competitiva" para descrever aquilo que Buffett chama de moat. No final das contas, as duas se referem a aspectos do negócio que são muito difíceis de serem replicados pela concorrência e que, portanto, conferem grande vantagem pra uma empresa.

Um exemplo? Marcas! E é sobre isso que me referi no post anterior quando citei a Disney. Se uma mãe for comprar um boneco para seu filho e encontrar um boneco da Disney pelo mesmo preço que um boneco genérico, qual você acha que ela vai comprar? Ela vai pensar em como um boneco de baixa qualidade pode ser arriscado para uma criança e seu cérebro vai acessar, ainda que inconscientemente, todas aquelas memórias que ela tem sobre o mundo mágico da Disney. E ela vai pensar que não só a Disney tem esse mundo mágico mas que a Disney também não arriscaria colocar seu nome em um brinquedo mal fabricado que pudesse colocar uma criança em uma situação de risco. Todas essas boas associações que fazemos automaticamente quando pensamos em uma marca acabam construindo uma poderosa vantagem competitiva.

Existem muitas outras vantagens competitivas além das marcas mas não vou entrar em detalhes agora. O objetivo do post é apenas familiarizar o leitor com o conceito de moat. Eu vou me referir a moats várias vezes nesse blog e portanto é importante que o leitor saiba o que isso quer dizer.

Apesar de ser um conceito simples de entender, não se iluda: quase tudo é difícil quando falamos em moats. Moats são difíceis de atacar, de construir, de medir e até mesmo de detectar. E na minha opinião é também um dos temas mais fascinantes, então pode esperar que ainda vou falar muito de moats por aqui.

Stay cool,
Don Black

Saturday, April 13, 2019

Inovação, por Bob Iger

Eu olho pra Disney e vejo uma das maiores - senão a maior - vantagem competitiva do planeta. A Disney é não só um dos maiores conglomerados de mídia do mundo como é também um intangível difícil de mensurar. Quanto vale a marca Disney? Quanto vale uma marca que tem tanto significado emocional para tanta gente no mundo inteiro?

Não importa se você vai na China ou no Alaska, todo mundo conhece o Mickey Mouse. E conhece também o Pateta, o pato Donald, a Bela Adormecida, o Simba, a Branca de Neve, a Frozen, etc, etc. As pessoas não só conhecem como boa parte delas tem uma memória feliz pra contar sobre algum personagem. Esses personagens são os melhores funcionários que uma empresa pode ter: encantam o consumidor, são conhecidos mundialmente, incrivelmente monetizáveis e não cobram nada. Se a Disney quiser fazer 5 minutos de propaganda com algum ator da Globo vai ter que pagar algum dinheiro e depois 99% do mundo não vai saber do que se trata. Mas basta colocar o Mickey e o retorno é estratosférico! Essa é a força dos personagens...

O homem a frente dessa marca é Bob Iger, CEO da The Walt Disney Company desde 2005. Iger entende a importância do intangível desses personagens como poucos e, não a toa, comprou a Pixar, Marvel e Lucasfilm. Iger comprou até a 21st Century Fox! E com isso juntaram-se ao seu exército de funcionários-estrela o Yoda, o Luke Skywalker, o Darth Vader, o Chewbacca, o Homem Aranha, o Hulk, o Nemo, a galera do Toy Story e mais alguns.

Depois de quase quinze anos a frente da empresa, Bob Iger já anunciou que vai deixar o cargo em 2021. Faltam apenas dois anos e Iger poderia estar apenas contando os dias mas ele quer mais, e anunciou recentemente o lançamento do serviço de streaming da Disney, o Disney+.

A beleza de ver um cara como o Iger encabeçando a iniciativa do Disney+ é perceber que nem mesmo aos olhos dele a Disney é uma empresa a salvo. Sim, a Disney tem essa grande marca e todos esses personagens que parecem tão eternos, mas a verdade é que no mundo das grandes vantagens competitivas tudo é eterno até que não seja mais. O cemitério das marcas está ai pra quem tiver dúvidas quanto à isso.

Pois bem, ontem mesmo Bob Iger deu uma excelente entrevista para a CNBC onde, entre tantas outras coisas, ele abordou essa questão da inovação. Aliás, eu recomendo que todos invistam 30 minutos para ver a entrevista inteira. Segue o link: https://www.cnbc.com/video/2019/04/12/disney-ceo-bob-iger-netflix-competitor.html

O ponto que eu quero detalhar da entrevista é esse aqui:

"
Iger: "Você não pode medir [nosso negócio] contra o que ele é hoje, você tem que medi-lo contra o que ele vai ser amanhã. E uma razão pela qual as empresas falham em inovar é porque elas continuam se medindo contra o que elas são hoje. Então se o seu negócio é vender filmes para fotografia (Kodak), você quer continuar vendendo o máximo de filmes que você puder... e você não está realmente pensando em filme para fotografia como um produto que está indo embora."

Faber: Ou talvez eles falharam em entender qual é o negócio deles. Não era sobre filme para fotografia, mas sobre capturar imagens...

Iger: Aquela indústria não deveria ter sido sobre fazer filmes, mas sobre tirar fotos e deixar os clientes fazerem isso da maneira como eles quisessem. E olha, existe muita pressão para não se fazer isso. Porque você está sendo pressionado pelos resultados trimestrais, pelos resultados anuais e pelos resultados do ano seguinte, e muitas vezes a remuneração é atrelada a isso. Então se torna muito difícil inovar porque você está muito preso ao modelo de negócio que te trouxe até aqui. O que pode ser ótimo, mas também evita que empresas pensem em como o modelo de negócios delas deve ser amanhã. E nós estamos em um mundo onde tudo está sofrendo disrupção. Como nos comunicamos, como nos transportamos, como fazemos compras...

Faber: Mas está claro que você não está casado com o modelo, com os modelos de distribuição, com que você esteve casado por anos...

Iger: Nós estamos casados é com a criação de grande conteúdo para ser comercializado. O que nós também acreditamos é que não importa como o marketplace mude ou como as pessoas ouçam as histórias, nós ainda assim seremos relevantes. Mas apenas se a gente se permitir ser distribuido e adquirido pelo consumidor de uma forma mais moderna. Se nós ficarmos presos no passado, isso pra mim é a receita da extinção.
"

O conteúdo desse trecho vale ouro! Repare como no final da entrevista o Iger reconhece que mesmo seu grande conteúdo pode acabar valendo muito pouco se nada for feito, o que é exatamente a motivação por trás da criação do Disney+.

O tema de inovação em grandes empresas é sempre sensível porque é muito difícil de executar. Apesar de todos os recursos disponíveis, existem muitas forças pró-inércia e Iger soube descrever isso com clareza. Enfim, pretendo voltar nesse assunto mais tarde mas por ora vou deixar vocês digerindo essas respostas do Iger.

Stay cool,
Don Black

Friday, April 12, 2019

Política II

No post anterior eu falei sobre as dificuldades encontradas pelo investidor que deixa a agenda política pautar o seu processo de investimento. Uma dificuldade acentuada pela mente política que o investidor carrega, presa fácil para todo o tipo de viés comportamental.

O primeiro grande favor que o investidor pode fazer a si mesmo é ignorar o curto prazo, habitat natural dos ruidos mais caóticos. O longo horizonte é mais gentil para apontar caminhos. Só o que o investidor precisa avaliar é se existe o ambiente para que grandes negócios nasçam e floresçam no longo prazo. Não é uma avaliação tão difícil de fazer. Pelo menos é mais fácil do que descobrir a próxima composição da Câmara dos Deputados. E a partir daí só existem dois caminhos a seguir: ou procurar outro lugar para colocar o dinheiro ou começar a busca por essas grandes empresas.

É meu entendimento que o Brasil é um desses países onde grandes negócios nascerão e florescerão no longo prazo. Isso basta. Que a gente vá ter uma Dilma aqui e um Bolsonaro acolá é bem provável e pouco importa, porque a partir desse ponto a questão passa a ser apenas encontrar as grandes empresas. Claro, o leitor é bem vindo para discordar e caso acredite que em 30 anos o Brasil estará muito parecido com a atual Venezuela o melhor a fazer é fugir imediatamente buscar outras alternativas.

Enquanto o investidor busca os grandes negócios é importante manter a vigilância e impedir que a política tome conta da sua vida. Vivemos em um ambiente onde todas as pessoas falam sobre política durante todo o tempo em todos os lugares. Não é uma influência fácil de evitar. Repare como mesmo profissionais que minimizam a importância da política nos investimentos estão o tempo inteiro debatendo e opinando política. Não é que eles seja hipócritas, eles apenas não se dão conta do que está acontecendo. E com isso a chance de que estes profissionais não estejam carregando seus vieses políticos para seus processos de investimentos é mínima - fato este que naturalmente eles também não percebem.

Vamos a uma breve fábula que descreve bem como tudo acontece. Para aqueles que desconhecem, a fábula do sapo cozido descreve a situação do sapo que vai sendo lentamente cozido vivo. A moral da fábula é que se o sapo fosse jogado de uma única vez em água fervente, ele pularia dali imediatamente. Mas se o sapo for colocado em água morna e a água for sendo fervida aos poucos, o sapo não perceberá o perigo e acabará cozido até o morte. Assim é a política para o investidor.

Por isso eu acho que o investidor está mais bem servido se mantiver a política a uma distância segura. O investidor fará melhor uso do tempo ao se dedicar a conhecer as milhares de empresas que existem por aí. É claro que a política ainda assim vai aparecer para o investidor como, por exemplo, em uma concessão para uma empresa do portfólio. Nesse momento é importante deixar o emocional de lado quando for incorporar o fato a análise.

Agora eu espero dar um bom tempo de escrever sobre política. Nada de esquerda, direita, previdência, Dilma, Bolsonaro, Lula, FHC, etc., por aqui. A política vai seguir seu louco caminho enquanto eu a ignoro, as grandes empresas vão seguir seu louco caminho enquanto tento ir atrás delas, e daqui a muitos anos acredito que vamos estar todos em melhor situação que hoje.

Stay cool,
Don Black

Thursday, April 11, 2019

Política I

A primeira ironia do blog começou cedo já que vou dedicar os primeiros posts a um assunto que pretendo nunca mais abordar por aqui. É como o velho conselho do Charlie Munger, "inverta, sempre inverta!". E é invertendo, buscando aquilo que vou evitar, que vou falar agora de política.

O ser humano tem fixação em política. É como uma droga: hoje você dá só uma opinião no bar e amanhã você está em guerra com sua família. Como é com todo dependente que tenta racionalizar seu vício, as desculpas são várias. No meu ramo de atuação o mais comum é dizer que é imprescindível na avaliação do futuro dos negócios. Sei...

O primeiro problema surge quando o investidor, munido dessa crença, se vê obrigado a antecipar o próximo passo político. O microcosmo político é caótico. Nem os políticos fazem idéia do que vem pela frente. Cientistas políticos renomados estão sempre sendo traídos pelos fatos. A imprensa, com suas tantas fontes confidenciais, passam ao largo da verdade com frequencia. Eventuais vantagens competitivas não criam videntes: somos todos péssimos!

O segundo problema surge quando, convicto acerca dos próximos acontecimentos políticos, o investidor tem que transformar sua tese política em investimento. O jogo de causa e consequencia entre política e investimento parece simples mas não é. Muita gente acreditou que uma vitória do Trump traria caos imediato e duradouro aos mercados. Ou seja, tudo muito longe do que se viu. Todo dia, em todo o mundo, surgem milhares de exemplos parecidos. Saber como o mercado vai tratar o desenrolar político só é simples quando olhamos no retrovisor.

Passar ileso pelos dois problemas acima não é fácil. Fica ainda mais difícil para o investidor que é também um fanático político. Nesse caso ele vai ter que lidar com a fragilidade das suas convicções políticas, um desafio e tanto para o cérebro viciado. Não é fácil acreditar que boas coisas virão das decisões daquele político que você despreza ou que tragédias virão das decisões daquele político com quem você tem um alinhamento de idéias.

Para tornar tudo ainda mais interessante, depois de encerrado o processo só o que o investidor precisa é repetir o ciclo de previsão e aposta. Saber o que está pra acontecer e saber onde colocar o dinheiro diante disso. Repetir sem parar, consistentemente. Repetir sempre e repetir certo.  O investidor não pode se dar ao luxo de ficar errando. O investidor não vai simplesmente ouvir piadas, ver uns memes debochados e seguir sua vida. O investidor vai perder dinheiro. E sempre que ele perder 50%, ele vai ter que fazer 100% pra voltar ao que era. Essa é a graça e a desgraça do investidor, nunca é só mais um dia de chutes e opiniões. Nunca é indiferente.

Enfim, acho mesmo que qualquer investidor que acredita ser possível vencer dessa maneira deveria ganhar um prêmio por sua fé. A questão é saber então o que fazer. Uma questão para o próximo post.

Stay cool,
Don Black

Começando

Eis que de alguma maneira você veio parar nesse blog. Entre todas as opções online parece incrível que você tenha parado aqui. Já que parou, espero honrar o seu tempo. Antes de tudo: seja bem vindo!

Eu sou Don Black. Sou investidor privado e invisto basicamente em empresas públicas nos Estados Unidos e Canadá. Por muito tempo venho me beneficiando do esforço e boa vontade de pessoas que compartilham excelente conteúdo nas redes, principalmente via twitter e blogs. Talvez seja minha hora de tentar dar alguma contribuição.

Honestamente, não tenho certeza se tenho tanta coisa interessante para escrever. Também não tenho pretensões de produzir nada científico ou muito elaborado. Esse blog é só um rabisco, com algumas visões minhas sobre investimentos e negócios. De forma geral, espero escrever sobre:

- Modelos de negócios
- Filosofias de investimentos
- Fanáticos inteligentes
- Avaliação de empresas

Se esse espaço se tornar uma troca de idéias, tanto melhor. É justamente pela troca de idéias que melhor consigo expandir meu círculo de competência. Então fique a vontade para deixar seus comentários.

Stay cool,
Don Black