Thursday, February 27, 2020

O moat do investidor





O finlandês voador, Paavo Nurmi

Paavo Nurmi é o nome do sujeito. O maior fenômeno do atletismo do início do século XX. 12 medalhas olímpicas, 9 de ouro. Corria 1.500 metros, 10.000 metros, prova com barreira, sem barreira e até cross country. Esta última uma prova tão perigosa que foi banida dos jogos olímpicos. 22 recordes mundiais, de 1500 a 20.000 metros. Na Olimpíada de Paris em 1924, Nurmi ganhou cinco medalhas de ouro em provas de longa distância... em apenas seis dias!

O grande segredo de Paavo Nurmi estava na sua abordagem analítica para o esporte. Paavo Nurmi nunca corria sem um cronômetro nas mãos. O finlandês voador nunca sorria. Apenas media. Era conhecido como "Homem Relógio". E sempre medindo ritmos e distâncias, Paavo Nurmi construiu estratégias vencedoras.

Sempre é possível tentar diminuir os feitos dos grandes vencedores. Perdedores são os especialistas nessa arte. Então quando falamos em Paavo Nurmi, é normal ouvirmos alguém dizer que não havia nada demais na sua estratégia. “A constante medição de ritmo é coisa óbvia no atletismo”, eles dizem. “Fosse hoje e Paavo Nurmi nem se classificaria”, os mesmos continuam dizendo.

Bom, isso pode ser verdade. E não obstante em nada diminui o brilhantismo de Paavo Nurmi. Ninguém pode ser avaliado fora do contexto do seu plano de jogo. E Paavo Nurmi encontrou seu grande diferencial dentro do seu plano de jogo. O resto é papo de perdedor na mesa do bar.

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Toda vantagem competitiva vive sob ataque. É consequencia da ambição humana e é bom que seja assim. Acontece nos negócios, acontece nos esportes. Os fundistas de todo o mundo não iriam se contentar em disputar apenas uma segunda colocação. Eles iriam tentar de tudo para vencer. O mais óbvio seria tentar o que funciona para o vencedor. Então todos os outros atletas começaram a cronometrar seus tempos como Paavo Nurmi fazia. E aos poucos Nurmi foi perdendo sua vantagem competitiva.

No momento em que Paavo Nurmi perde o monopólio do seu diferencial, uma melhoria na sua marca já não tem mais o mesmo impacto de outrora. Isso porque a essa altura todos os outros competidores já estão muito melhores do que antes. Em ambientes competitivos, a habilidade relativa é mais importante do que a habilidade absoluta. E como em ambientes competitivos há uma constante busca pelo primeiro lugar, cria-se o que é conhecido como paradoxo da habilidade.

O paradoxo da habilidade aparece quando um grupo se torna cada vez melhor em uma atividade. A medida que isso acontece, a diferença entre o melhor do grupo e a média do grupo e a diferença entre o melhor do grupo e o pior do grupo tendem a diminuir. E quando a diferença relativa das habilidades diminui, a habilidade deixa de ser um fator decisivo. Não ter te tira do jogo mas ter não te garante nada.

Então, resumindo, paradoxo da habilidade é quando o grupo se torna tão habilidoso que a habilidade passa a ser menos importante na definição do vencedor. E isso acontece muito no mundo dos investimentos. Foi por isso que Ed Thorp fechou a Princeton Newport, foi por isso que a velha estratégia de Graham perdeu importância, e por aí vai.

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Sempre que a habilidade está nivelada, a importância da sorte aumenta. Afinal, sorte é residual. Sorte é aquilo que sobra do resultado depois que o componente da habilidade é retirado. Mas contar com a sorte definitivamente não é uma estratégia, muito embora muitos não saibam fazer diferente.

O objetivo deve ser sempre o de maximizar os resultados minimizando a importância da sorte. Mas o que fazer diante do paradoxo da habilidade? Bom, devemos procurar um outro campo de jogo. Ou uma nova habilidade que ninguém tenha. Enfim, temos que buscar ser como Paavo Nurmi e correr com um cronômetro na mão quando ninguém mais o faz. Temos que buscar nosso diferencial competitivo.

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Não é fácil ter um diferencial nos investimentos. Você sabe Valuation? Legal, mas todo mundo sabe. Valuation é commodity. Python? Commodity! Eu sei que você pode achar que não é só porque no seu grupo de investimentos do Whatsapp pouca gente sabe mas a verdade é que seu grupo do Whatsapp não representa muita coisa. Python é commodity!

Ah, você é experiente? Entendi. Pois então me diga a data de corte que transforma idade em diferencial competitivo, por gentileza. Vou assistir Netflix enquanto espero a minha chegar lá. Já sei! Você acha que entende de negócios melhor do que todo mundo, certo? Ok, boa sorte com isso!

Sério, ter um diferencial é difícil. Existe muita gente muito boa no mercado. Muita mesmo. E elas se agrupam formando grandes empresas repletas de gente muito boa. Esse é um fato que não pode ser ignorado e acredito sempre no valor de reconhecer, racionalmente, a realidade da vida.

Claro, nem todos concordam. Me lembro como se fosse ontem quando meu primeiro filho nasceu. Minha esposa, mãe de primeira viagem, ficou encantada. Achou aquele pequenino ser humano a criatura mais linda da face da terra. Não sei como e nem porque, mas ela notou também sinais de inteligência superior. “Viu como nosso filho é inteligente? Nossa, nunca vi tão inteligente!”

Foi em um rasgo de honestidade, um reflexo impensado, que cometi meu primeiro erro como pai: “Pode até ser brilhante mas a chance maior é de que ele seja mediano.” Minha esposa estava mais interessada em conjecturar sobre os dotes extraordinários do seu bebê do que em base rates e deixou isso claro ao me ignorar pelas 24 horas seguintes.

Enfim, meu ponto é que o emocional distorce a percepção da realidade. E se queremos encontrar um diferencial na hora de investir devemos fazer melhor do que simplesmente acreditar que temos algum talento sobrenatural. Encontrar seu nicho é interessante. Um ambiente onde suas habilidades são armas para o sucesso e não são compartilhadas por muitos concorrentes. Como se Paavo Nurmi pudesse usar seu cronômetro onde ninguém mais pode. Para isso eu acho interessante caracterizar diferentes fontes de vantagem competitiva e ver onde é possível se encaixar. Por exemplo:

Informação e processamento

Informação já foi grande fonte de diferencial competitivo. Coisas que hoje são simples não eram tão simples assim. Ter acesso aos relatórios da empresa, dados de mercado e informações da indústria exigiam boa dose de disposição, deslocamento e acesso. A internet facilitou a vida dos investidores. Acontece que como facilitou a vida de todos os investidores, acabou dificultando a vida daqueles que tinham melhores informações (lembra do paradoxo da habilidade?)

Claro, informação continua sendo uma fonte de diferencial. Apenas é um diferencial mais difícil de alcançar. Principalmente se for dentro da legalidade, que é o que devemos almejar e é onde muitos insistem em ignorar. Mas um investidor que consegue capturar dados de qualidade e, ainda mais importante, consegue processar esses dados, tem grande vantagem. É o caso do Medallion, eu imagino. E é óbvio que é uma vantagem que eu nunca busquei. Qual é a minha chance de colher e processar dados melhor do que os astronautas da Rentech? No máximo eu me aproveito de algum conhecimento específico de uma indústria. Um negócio mais Peter Lynch e menos Jim Simons.

Comportamental

A vantagem comportamental vem quando não caímos nas armadilhas psicológicas que comprometem nossos retornos. Muita gente conhece aquela estatística que diz que os cotistas de um fundo tem resultados piores do que o fundo em si. Acontece porque os cotistas não conseguem se conter. Eles se apavoram quando devem se animar e se animam quando devem se apavorar. Com isso resgatam quando devem aplicar e aplicam quando devem resgatar. É uma dança sem sincronia. E é difícil de evitar.

Acredito que parte da vantagem comportamental está na natureza de cada um. Existem os que se desesperam mais do que os outros quando perdem metade do patrimônio por exemplo. Alguns se traumatizam enquanto outros seguem em frente. É assim em muito daquilo que o ser humano é exposto. Diferentes pessoas tem diferentes reações a abusos sofridos, ao perigo, a vírus e bactérias, ao alimento ingerido e por aí vai. E diferentes pessoas tem diferentes reações ao Mr. Market.

“Apenas os disciplinados são livres. Se você é indiscipliano, você é escravo do seu humor e das suas paixões.", Eliud Kipchoge

Mas acredito também que parte vem da disciplina e diligência. O investidor que antecipa os cenários, que estabelece qual deve ser seu modus operandi em diferentes situações, que constrói um processo, fica mais preparado para resistir aos vieses comportamentais.

Institucional.

É comum no Brasil separarem os participantes entre tubarões e sardinhas. Eu não sei ao certo o que isso quer dizer. Tubarão é o profissional? Tubarão é o que tem mais patrimônio? Tubarão é o institucional? Eu não sei... Mas intuitivamente eu sinto que há grandes vantagens em ser “sardinha”, já que são pequenos e ágeis.

Muitos problemas existem para os institucionais. Os fundos, por exemplo. Fundo não pode se meter com empresas sem liquidez pela simples razão de que os cotistas não sabem lidar com falta de liquidez. Claro, um fundo alinhado com a base de passivo conseguiria. Mas com passivo pulverizado e aplicações iniciais de mil reais e até de cem reais, qual fundo sem liquidez pode se alinhar com a base de clientes? A prudente medida de pulverização do passivo que os fundos adotam deixam oportunidades para o investidor individual. Afinal o investidor individual deve ser, por definição, alinhado com o cotista que, no caso, é ele mesmo!

E assim como o exemplo da liquidez, existem muitas outras situações onde os limites dos institucionais se traduzem em oportunidades para a pessoa física. O investidor individual pode comprar empresas sem liquidez, empresas pequenas, pode focar de verdade no longo prazo, pode concentrar, não precisa se preocupar com riscos de carreira, etc. As possibilidades são enormes!

O grande problema que vejo é que o sardinha quer seguir a orientação do tubarão. Não é boa medida. Se você tem um 4x4, você não vai chegar mais rápido do que o carro esportivo se você for pelo asfalto. Você vai ter que pegar a estrada de terra. Mas se você for pedir orientação para o piloto do esportivo sobre o melhor caminho, qual você acha que ele vai indicar? E assim acontece com investimentos.

Quem quer usar sua vantagem competitiva de investidor individual (ou sardinha, como queira) tem que ter independência intelectual. Tem que aprender a caçar em regiões onde os grandes caçadores não chegam. Do contrário vai ser apenas um 4x4 na Fórmula 1.


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Eu acho curioso como todo investidor pensa em moats e vantagens competitivas quando avaliam as empresas mas não olham no espelho para procurar suas próprias vantagens competitivas enquanto investidor.

O que você traz pra mesa que vai te fazer ganhar? Deixe o emocional de lado na hora de responder. Não importa o que sua mãe tenha dito durante sua infância, a chance é enorme de que você não é extraordinário.

Pense também que o Mr. Market é como um leão faminto. Ele não quer saber do seu QI, de onde você trabalhou, da sua idade, dos seus títulos ou do seu currículo antes de decidir se vai te devorar ou não. Se é isso o que você traz pra mesa, é melhor apenas procurar um emprego. Aí você pode abraçar o índice e ser feliz com suas taxas.

Se você for encarar o Mr. Market de verdade você tem que trazê-lo para o seu plano de jogo. Sempre com realismo e sem se superestimar. Contra um leão, mais vale ser um iletrado na Patagônia do que um nobel na savana.


Stay cool,
Don Black



Tuesday, February 11, 2020

IRB Brasil RE, alerta a primeira vista

INTRO

Nos últimos dias uma conhecida gestora resolveu deixar as gentilezas de lado - coisa rara no mercado brasileiro - e partiu para a ofensiva. Divulgou uma carta questionando os números da resseguradora IRB, a empresa respondeu e a gestora soltou a tréplica. No meio do embate as ações cairam uns 20% do topo.

Eu não vou avaliar nenhum comunicado aqui pela simples razão de que não li nada. Qualquer investidor que busca entender a IRB e ainda não sabe nada da empresa deve postergar essa leitura. Olhar a resposta do colega antes de tentar fazer a questão é um péssimo método de aprendizagem. Fica ainda mais doloroso se o colega erra. Alguns ensinamentos aparecem cedo nas nossas vidas mas fazemos questão de seguir ignorando. E a nota perdida na prova durante a infância é o dinheiro perdido no mercado durante a fase adulta.

Enfim, fato é que a situação me chamou atenção. Embates desse tipo não são comuns no Brasil, onde há predominância do compadrio. Além disso, o impacto no preço das ações deve ser visto como uma oportunidade em potencial. Nada pode ser melhor para um comprador de empresas do que acentuada queda por um relatório infundado.

Mas a verdade é que vou dar uma olhada por pura curiosidade mesmo. Situações como essa tem dois finais possíveis: ou executivos são desmascarados em sua farsa/incompetência ou gestores são desmoralizados publicamente. E assim fica até que o tempo apague os rastros de destruição ou que o compadrio costumeiro leve a uma reconciliação. E por curiosidade quero ter alguma opinião, por mais básica que seja, enquanto observo o desenrolar dos fatos. Então vamos lá.

AS SEGURADORAS

Como a IRB é uma resseguradora, que nada mais é do que uma seguradora de uma seguradora, convém entender o que é uma seguradora.

O negócio é simples: uma seguradora recebe o prêmio, faz investimentos e paga o sinistro. Apenas isso. Então podemos dizer que uma seguradora tem duas fontes de rentabilidade: o investimento e o underwriting.

Investimento.

A receita de investimento existe porque o sinistro só é pago depois do prêmio. Então até que o sinistro seja pago, a seguradora vai acumulando os pagamentos dos prêmios. Esse acumulado, de forma simplificada, é o que chamamos de float. E ele é reinvestido para gerar retornos para a seguradora.

A principal razão de Warren Buffett gostar tanto de seguradoras é o float. Por ser um extraordinário alocador de capital, ele consegue gerar altos retornos sobre o float investido. Mas é claro que não existem muitos Buffetts no mundo e poucas seguradoras vão conseguir extrair o mesmo valor do float que Buffett extraiu ao longo da sua carreira.

Mesmo sem um Buffett no comando, nenhuma seguradora vai deixar o float em caixa. Toda seguradora reinveste o float e o perfil do investimento depende das características dos seguros emitidos, como por exemplo a frequência da sinistralidade. Então é importante que a seguradora conheça o seu mercado e é aqui que entra a habilidade de underwriting/subscrição.

Underwriting.  

A outra fonte de renda das seguradoras é a diferença entre os prêmios recebidos e os sinistros pagos. E aqui está o encanto do negócio porque quando a apólice é emitida, a seguradora sabe quanto vai receber mas não sabe quanto/se/quando vai pagar. Essa incerteza tem que estar refletida da melhor forma possível na precificação do seguro emitido.

Saber precificar o portfólio é o que separa as melhores seguradoras do resto. E é mais difícil do que aparenta. Quando o dinheiro é abundante, a concorrência entre as seguradoras aumenta e elas fazem precificações mais agressivas. Tudo para fechar mais negócios. A consequência desse relaxamento invariavelmente são grandes perdas que aparecem lá na frente. Por outro lado, quando o dinheiro fica escasso os prêmios sobem e as seguradoras que seguem no jogo lucram mais.

As melhores seguradoras navegam bem por esses ciclos, evitando principalmente a tentação de emitir apólices a preços baixos. Diferentemente do que se pode imaginar, uma seguradora não ganha dinheiro por emitir mais apólices, mas por ter uma relação risco/preço favorável.

E com essa introdução da indústria de seguros, vamos agora para uma breve primeira impressão da IRB.

A IRB


A IRB é a maior resseguradora do Brasil e uma das maiores do mundo em valor de mercado. Foi fundada em 1939 como empresa de resseguro monopolista no país. Manteve-se monopolista até 2007 quando, quase 7 décadas após a fundação da empresa, um novo modelo de operações de resseguro deu início à abertura do mercado. Apesar da abertura, a IRB segue com ampla liderança de market share no país. O IPO na B3 veio em 2017.

O que logo chama atenção na IRB é seu ROE na faixa de 35%, muito acima da média da indústria global de resseguro. Resseguradores globais, que experimentaram ROE de 12% em 2016, sofreram pressão operacional recente. Juros menores e catástrofes como os furacões Irma e Maria contribuiram para esses resultados. As renovações de 2019 foram a preços maiores e a indústria deu um respiro. Um respiro de 9% ROE para a maioria e de quase 15% para alguns felizardos. Nada próximo dos 35% da IRB.

Contudo, parte da diferença é bem justificada. A IRB é uma resseguradora brasileira que gozou de anos de monopólio. É uma experiência atuarial que nenhuma outra tem, em um país de baixa exposição a grandes catástrofes naturais. Um ROE acima da média global é aceitável. Mas confesso que um ROE tão acima parece demais.




O perfil do resultado da companhia passou por uma boa evolução. O resultado técnico cresceu e hoje é predominante em relação ao resultado financeiro. A própria queda recente dos resultados financeiros contribuiu para essa mudança de perfil, resultado da redução dos juros.


Uma política de alocação de capital agressiva coloca em risco a capacidade de uma seguradora em honrar os compromissos o que, em larga escala, traz grande insegurança para um país. É pensando nisso que muitos reguladores estabelecem critérios sobre como uma seguradora pode alocar o float. Minha breve pesquisa me mostrou que a SUSEP força as seguradoras a carregar uma grande posição em títulos públicos.

Essa deliberação da SUSEP tem consequencias na avaliação de uma seguradora porque ela elimina o prêmio que um comprador poderia pagar pelo book de investimentos e pela habilidade do alocador. Por que pagar caro em uma empresa cuja boa parte do resultado vem de um grande book de LFT?




Quando passei os olhos pela emissão de prêmios eu tive uma surpresa. Boa parte dos prêmios emitidos estão no exterior. Mais do que isso, boa parte da evolução dos prêmios emitidos nos últimos anos veio do exterior. Enquanto desde 2016 BR teve um CAGR de 7%, exterior teve um CAGR de 43%.


Até aqui eu não sabia que a IRB tinha atuação fora do país (desculpem a ignorância!). Então de repente não só fiquei sabendo que a IRB atuava fora como fiquei sabendo também que 43% (!) dos prêmios emitidos nos últimos 12 meses veio da carteira internacional, que também tem sido o grande motor de crescimento da companhia. Uau!

Bom, isso muda um pouco as coisas. É sempre importante entender o contexto e, aqui, habilidade de subscrição não existe sem familiaridade. Aliás, essa é uma das razões por trás das atividades de M&A na indústria. Players que querem expandir sua atuação geográfica vêem mais sentido em comprar alguém do que em começar a partir de um banco de dados em branco. Um exemplo recente foi a aquisição da Hanover Insurance pela China Re.

Então se colocamos uma empresa com sete décadas de monopólio nacional em outro ambiente, é de se esperar que ela tenha problemas de adaptação. Ou pelo menos foi o que eu imaginei.



Eis que tive mais uma surpresa! Tudo melhorou ainda mais quando a IRB se aventurou em terras desconhecidas. Enquanto o underwriting evoluiu, sinistralidade e índice combinado caíram.

Existe sempre a tentação de atribuir grandes resultados à gestão superior. De fato, uma conclusão verdadeira em muitos casos. Mas não em todos. Resultado de curto prazo de resseguradora não é um deles pela simples razão de que em resseguros os eventos são de baixa frequência e perda substancial. Erros de precificação e provisionamento são agradáveis no início e fatais na hora da cobertura. Uma cobertura que em resseguros leva anos para aparecer, mas que aparece.

Como a indústria de resseguro é competitiva e largamente commoditizada fica difícil inventar a roda. As melhores resseguradoras globais já são conhecidas. Já passaram por eventos de catástrofe, navegaram pelos ciclos, tem amplo colchão de ativo e grande capacidade de subscrição. Começar agora e apresentar números muito melhores do que essas resseguradoras é mais um sinal de alerta do que de euforia.

E a medida que a IRB expande internacionalmente, mais ela deve ser comparada a esses grandes resseguradores globais. Todos eles, diga-se, com combinado próximo de 100% e sinistralidade de 80%.

E ENTÃO, É FRAUDE?

Não sei. Fraudes são difíceis de detectar, principalmente quando podem ser travestidas de incompetência. Encontrar fraude requer um trabalho minucioso e diligente, que é tudo o que eu não fiz aqui. De qualquer forma, não acredito que alguém vá conseguir provar alguma coisa nesse sentido com a IRB.

Mas minha experiência com a indústria me coloca sim em alerta com a IRB. Os números não se encaixam como seria esperado de uma resseguradora desse perfil. Com um pouco mais de dedicação eu observaria se há efeitos extraordinários nesse ROE de 35%, buscaria conhecer mais dos resseguradores atuantes nos países onde a IRB está entrando e gastaria mais tempo analisando as provisões da empresa.

Como confiar nas estimativas de perda de uma seguradora? Histórico e reputação. Como diz o ditado, "Se em uma corrida você não conhece os carros, conheça os pilotos."

É bom exercício procurar saber quem são os executivos da IRB. Principalmente considerando o histórico da União na companhia. Executivos são especialmente importantes no ramo de seguros. Devem ser profissionais de carreira e não aventureiros. Então é bom observar seus currículos e se seus incentivos estão ao menos alinhados com os ciclos de uma resseguradora.

Para encerrar, com o pouco que vi, se eu tivesse que atribuir um valor para a IRB eu atribuiria menos da metade do seu valor atual. Então a ação vai cair? Eu acho que é correto dizer que uma hora os números tem que fazer sentido. Mas pode demorar, ainda mais com uma resseguradora. Uma lição que a gestora vem aprendendo da pior maneira, cansou de esperar e resolveu tentar acelerar o processo. Vamos ver.

Stay cool,
Don Black