“Todo investimento inteligente é value investing; então adquira mais do que você está pagando. Investir é onde você encontra algumas grandes empresas e depois fica com a bunda sentada.”, Charlie Munger
Value
Investing é um velho incompreendido. Não sei bem a razão de tanta
incompreensão. Sendo justo, value investing é o conceito mais trivial que
existe. Ou talvez seja essa a razão. Value investing é fácil demais para os especialistas
de finanças.
A base do
value investing é a idéia de que valor e preço são coisas diferentes. Preço é
por quanto podemos comprar ou vender um negócio e valor é o quanto o negócio
vale. Donde se conclui naturalmente que o objetivo é comprar um negócio por um
preço abaixo do seu valor e vende-lo por um preço acima do seu valor. Pronto,
isso é value investing!
Dar essa
explicação para um leigo é sempre uma experiência de humildade, já que o leigo
sempre joga na sua cara a obviedade da idéia de “comprar barato e vender caro”.
E ele tem razão, é realmente óbvio. Tão óbvio que me faz pensar que o primeiro sujeito
a abraçar o value investing deve datar do início das trocas comerciais entre os
seres humanos. Mas ainda assim o sujeito que leva a fama como pai do value
investing atende pelo nome de Benjamin Graham e nasceu na Londres de 1984.
“Uma operação de investimento é uma onde, após ampla análise, promete segurança de capital e um retorno adequado. Operações que não satisfazem esse critério são especulativas.”, Ben Graham
Value
investing depende só de duas coisas: preço e valor. Preço é fato. Valor não é. Valor
é uma noção subjetiva. Se vários value investors forem atribuir valor a uma
mesma empresa, as chances são de que os valores vão variar. E dessa
subjetividade nasce muita incompreensão.
Quem disse
que value investing é comprar apenas empresas com desconto para o book value
tangível ou com baixo price to earning e price to book? Uma empresa em
deterioração encontra pouco conforto em um book value tangível. Não acredita em
mim? Pergunte à Macys então. Se o ferramental é pobre em descrever o valor de
uma empresa, seu uso não faz parte de uma estratégia value investing.
Repare nos
nomes dos investidores que eu citei ali em cima. Observe suas estratégias. Schloss é da velha guarda de Graham e buscava
descontos para book value com ampla diversificação. Davis buscava empresas com
potencial de crescimento de lucros. Greenblatt se dedica a procurar vantagens
competitivas (e inclusive escreveu um belo livro sobre o assunto). E Buffett?
Buffett é um camaleão, tendo adaptado muito sua estratégia ao longo das
décadas. E no entanto, todos value investors.
***
Vamos ler
de novo esse negócio colocando de um jeito que me faça sentir bem importante, o self-quoting:
“Se o ferramental é pobre em descrever o valor de uma empresa, seu uso não faz parte de uma estratégia value investing.”, Don Black
Eu sei que
é uma lógica decepcionante essa. Seria muito mais fácil aplicar um múltiplo price
to book em todas as empresas do mundo como se não houvessem maiores
considerações a fazer. Mas não é assim que funciona. E não é isso que o value
investing defende.
Não
obstante muitos acreditam que as velhas métricas de valor estão eternizadas em
alguma pedra sagrada e são, portanto, o que define o value investing. É dai que
começa a discussão entre value x growth por exemplo. Besteira, tudo besteira.
O valor de
uma empresa depende do valor presente do seu fluxo de caixa, seja ela uma barraca
de mariola ou o Google. Entender esse valor – seja para a barraca de mariola ou
para o Google – é o exercício do value investing. Na reunião da Berkshire de
2000 Buffett foi especificamente perguntado sobre value e growth, no que respondeu:
“Não são duas categorias diferentes de negócios. O valor presente do caixa que uma empresa gera é quanto vale o negócio. Não existe diferença nas nossas cabeças sobre value e growth. Em toda decisão você tem que definir o quanto de valor você vai receber.”, Warren Buffett
Mas o value
investor é um animal conservador. É investimento quando “após ampla análise, promete segurança de
capital e um retorno adequado”, lembram? Daí derivam os importantes conceitos
de margem de segurança e círculo de competência, nascidos dentro do value
investing.
Acontece
que não é sempre que o valor de uma empresa já está bem refletido na sua
condição presente. Muitas vezes boa parte do valor está no seu crescimento
futuro. E o que o value investor faz é reduzir seu risco se distanciando de
empresas onde boa parte do valor é derivado de muita incerteza. É por isso, e
somente por isso, que muitos value investors viram as costas para empresas
conhecidas como growth companies, e não porque growth seja diferente de value. Entenderam?
É disso que se trata quando Munger e Buffett lamentam o terrível erro de não
terem investido no Google há anos atrás.
"Podiamos ver nas nossas operações como a publicidade no Google estava funcionando bem. E no entanto ficamos parados lá chupando os dedos. Eu me sinto um idiota por não ter identificado o Google. E acho que Warren se sente igual. Nós fizemos merda.", Charlie Munger
Se o value
investor é conservador e se boa parte do valor de uma growth company vem do seu
crescimento futuro, então não é o mesmo que dizer que value e growth são diferentes
em termos práticos?
Eu vivi essa
geração até certo ponto mas sempre acreditei que o círculo de competência de um
investidor não pode ignorar tendências seculares. Por isso me esforcei para
entender as empresas da era da internet (e só Deus sabe o quanto penei!). A
internet foi e ainda é uma tendência secular. Assim como foi a manufatura em
determinado ponto da História.
Me lembro
até hoje de uma pergunta que fizeram para Buffett sobre o que ele começaria aprendendo
se ele estivesse começando hoje. A resposta? Tecnologia. E eu acho que é isso
que acontece com os novos - e bons, claro! - value investors. Eles são versados no assunto, sabem
aproximar o valor desse tipo de empresa. Tecnologia faz parte do círculo de
competência deles e é um tema onde eles podem investir aplicando a margem de
segurança. Eu vi isso acontecer com grandes value investors de gerações mais
recentes em investimentos como Netflix por exemplo.
Então o que
eu vejo é o value investing seguindo seu curso ao longo do tempo. Estratégias
vão sendo adaptadas para que o investidor tenha o ferramental certo para estimar
o valor das empresas do seu tempo. Mas sempre com a noção de que preço e valor
são diferentes. Sempre com o objetivo de pagar abaixo do valor e vender acima.
Sempre assessorado por margem de segurança. Coisas simples, que nunca vão
agradar uma academia de ciências mas que são amigas da conta bancária.
Stay cool,
Don Black