Thursday, June 27, 2019

Fontes de Moat


Esse post vai ser o segundo da sequência que falo sobre moats. No primeiro, que pode ser lido aqui, o foco foi na definição do conceito. Já nesse post de hoje vou listar as diferentes fontes de moat. É justo dizer que essa lista varia de investidor para investidor, mas também é verdade que todas as listas são muito parecidas. Pode ter uma diferença na forma como se agrupam os diferentes atributos ou nos nomes dados aos atributos mas no fim é tudo igual.

Para refrescar a memória, moats são atributos estruturais que permitem que um negócio tenha altos retornos sobre capital por um longo período de tempo. Esses atributos protegem a empresa da concorrência por que são muito difíceis de serem replicados e atacados. Indo ao ponto, esses atributos são:

1. GOVERNO

Licenças governamentais e concessões públicas são fontes de moat a medida que criam grandes barreiras para a concorrência.

Imagine a cena: chegou o tão aguardado feriado e você pega o carro para viajar com sua família. Quando chega a hora de pagar pedágio você vê que cada cabine de pagamento cobra um valor diferente. Como o serviço é simplesmente passar por uma cancela e seguir na mesma estrada, todo mundo resolve ir para a cabine mais barata. Em determinado momento a cabine mais barata tem muita fila e passa a valer mais a pena pagar um pouco mais e ir pra outra cabine. A essa altura a diferença de preço já não é mais tão grande assim, já que todas as cabines estão em guerra para atrair clientes.

Enfim, esse é um cenário que não acontece. Não acontece por que todas as cabines pertencem a uma mesma empresa; empresa esta que ganhou alguma licitação lá atrás e por isso o governo se assegura de que nenhuma outra concorrente vai poder explorar aquela estrada pelo tempo da concessão.

A mão do governo também aparece em uma série de licenças e certificações que são exigidas para atuar em determinadas indústrias. Como a obtenção dessas permissões gastam tempo e dinheiro, a barreira para novos entrantes aumenta.


2. PATENTES

As patentes são barreiras legais que bloqueiam a participação da concorrência. Muito comum nas indústrias farmacêutica e de tecnologia, a patente garante à empresa exclusividade na exploração de um produto ou idéia por um determinado tempo.

Existe uma velha crítica social envolvendo as patentes. O que se argumenta é que elas evitam a concorrência e, consequentemente, evitam também preços mais baratos para os consumidores em produtos essenciais. Ainda que tenha algum mérito, a verdade é que as inovações sequer chegariam ao mercado sem as patentes. Isso por que elas permitem que o inovador ganhe um retorno adequado sobre o capital investido em pesquisa e desenvolvimento. Sem as patentes, as empresas não teriam incentivos para inovar. 

3. NETWORK EFFECTS

Ou efeitos de rede. É um dos meus favoritos! O efeito de rede existe quando o valor do serviço/produto cresce a medida que mais pessoas utilizam o serviço/produto. É o caso de empresas como Visa, Uber, iFood e Facebook.

A beleza do efeito de rede é que cada novo nó faz com que o número de potenciais conexões na rede cresça exponencialmente. Uma vez alcançada a massa crítica, o crescimento de uma empresa que conta com efeito de rede é vertiginoso, tornando-a dominante em sua indústria. 

O efeito de rede é uma fonte de moat por que uma empresa concorrente, com suas poucas conexões, não consegue gerar o mesmo valor para quem usa. E como já existe alternativa, fica mais difícil para essa concorrente atrair clientes ou usuários. Pense no seguinte: você acha que seria fácil atrair um usuário do Instagram para a sua recém-criada e desconhecida rede social de postagem de fotos?

4. CUSTO

A vantagem de custo é uma das fontes de moat mais comum. Significa ter a capacidade de operar a um menor custo de forma a poder vender a preços mais baixos do que os concorrentes e, assim, eliminar a competição.

Vantagens de custo podem vir desde eficiências operacionais até economias de escala. Na crônica sobre o Sam Walton eu falei sobre como o Walmart avançou nas pequenas cidades americanas até eventualmente atingir os grandes centros. O alto número de lojas e vasta rede de distribuição deram grande poder de barganha para o Walmart negociar com fornecedores e repassar os descontos para seus clientes. Não foi a toa que, sem poder competir em preço, muitos varejistas menores acabaram quebrando nas cidades onde o Walmart chegou.

5. MARCAS



“nós nunca vamos criar alguma coisa valendo 2 trilhões de dólares a partir da venda de uma bebida genérica. Sendo assim, nós temos que fazer do seu nome, “Coca-Cola”, uma marca forte e legalmente protegida.” – Charlie Munger

Marca é uma outra fonte de moat que explorei em post anterior, dessa vez quando falei sobre a Disney. Quem nunca esteve em dúvidas na hora da compra e acabou escolhendo um produto apenas por que era de uma marca conhecida?

Um dos investimentos mais icônicos de Buffett e Munger foi a See's Candies. A See's Candies é uma famosa marca de chocolates americana, uma espécie de Kopenhagen da Califórnia. Segundo Buffett, na Califórnia todo mundo tem alguma lembrança especial sobre a See's Candies. Então não é surpresa que quando chega uma data como o Dia dos Namorados ninguém deixa de comprar uma caixa da See's Candies para comprar o chocolate de uma marca genérica.

É importante que o investidor não caia na armadilha de achar que basta uma marca ser famosa para ela ser um moat. Ser conhecida é uma condição necessária porém não suficiente para uma marca ser um moat. É preciso que a marca tenha força para afetar o comportamento do consumidor, tornando-o um cliente cativo ou um cliente que esteja disposto a pagar mais pela marca. Sem isso, não há um moat em torno da marca.

6. SWITCHING COSTS

Outro dos meus favoritos! É quando o custo de trocar de produto excede o valor que o consumidor vai receber ao efetuar a troca. O switching cost pode ser financeiro - como uma multa em caso de quebra de contrato - mas nem sempre é assim. As vezes o switching cost pode estar relacionado ao esforço que o cliente terá que fazer para trocar de produto. Exemplo? Software corporativo!

Pense num empresário que possui várias lojas de material de construção. Ele utiliza um sistema que o ajuda a controlar o seu estoque e fluxo de caixa. O sistema ainda emite nota fiscal e se comunica direto com o contador. Além disso ele gera automaticamente relatórios que ajudam o empresário nas tomadas de decisão e que alertam para riscos no negócio. O software pode não ser perfeito mas é bom o suficiente e custa apenas 200 reais por mês. Além disso o empresário e os funcionários já estão acostumados com a usabilidade e já tiveram o trabalho de cadastrar os centenas de clientes e produtos no sistema.

Como você convence esse empresário a usar outro sistema? Como você convence ele a trocar e recadastrar todos os produtos e todos os clientes, reeducar todos os funcionários para o novo sistema, se readaptar a um novo layout e criar novamente os relatórios que ele quer? Isso sem falar nos bugs que aparecem quando passamos a usar um software novo. Ainda que você cobre 50% a menos, dificilmente esse empresário vai trocar de sistema. A simples idéia de passar pelo transtorno da troca já é dolorosa por si só.  É por isso que uma empresa como a Linx tem uma taxa de retenção tão alta.

Para poder identificar o switching cost é importante ter um bom entendimento da experiência do cliente, o que pode ser difícil quando se está de fora. Por isso o investidor deve sempre procurar ser cliente daquela empresa que está sendo avaliada ou, caso não seja possível, se conectar com um bom número de clientes.


O PREÇO DA RENTABILIDADE É A ETERNA VIGILÂNCIA

É possível – e preferível - que uma empresa tenha mais de um moat. A Coca-Cola tem não só uma marca forte como também economia de escala a partir de uma ampla rede de  engarrafadores. Além disso, a Coca-Cola também possui fórmula proprietária. Uma empresa que apresenta uma combinação de moats tem proteções extras no seu negócio.

Antes de finalizar esse post, é importante deixar claro uma coisa: um moat não é uma armadura de invencibilidade! A Sears já representou 1% de todo o PIB dos Estados Unidos, a Kodak era uma marca reconhecida e o Orkut tinha efeito de rede. Todos eles evaporaram.

Isso acontece por que um moat pode se expandir ou encolher ao longo do tempo. Por isso é importante que o investidor afaste a complacência e esteja constantemente reavaliando as empresas. É importante que o investidor reavalie se o moat está se deteriorando ou se fortalecendo. Uma dica? Observe o pricing power da empresa. Ou seja, a capacidade que a empresa tem de aumentar preços sem perder clientes. Uma empresa com muito pricing power é uma empresa que tem um moat.

Mais pra frente pretendo entrar em mais detalhes sobre como medir moats mas, por enquanto, é só.

Stay cool,
Don Black

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