Esse post
vai ser o segundo da sequência que falo sobre moats. No primeiro, que pode ser
lido aqui, o foco foi na definição do conceito. Já nesse post de hoje vou listar
as diferentes fontes de moat. É justo dizer que essa lista varia de investidor
para investidor, mas também é verdade que todas as listas são muito parecidas.
Pode ter uma diferença na forma como se agrupam os diferentes atributos ou nos
nomes dados aos atributos mas no fim é tudo igual.
Para
refrescar a memória, moats são atributos estruturais que permitem que um
negócio tenha altos retornos sobre capital por um longo período de tempo. Esses
atributos protegem a empresa da concorrência por que são muito difíceis de
serem replicados e atacados. Indo ao ponto, esses atributos são:
1. GOVERNO
Licenças governamentais
e concessões públicas são fontes de moat a medida que criam grandes barreiras para
a concorrência.
Imagine a
cena: chegou o tão aguardado feriado e você pega o carro para viajar com sua
família. Quando chega a hora de pagar pedágio você vê que cada cabine de
pagamento cobra um valor diferente. Como o serviço é simplesmente passar por
uma cancela e seguir na mesma estrada, todo mundo resolve ir para a cabine mais
barata. Em determinado momento a cabine mais barata tem muita fila e passa a
valer mais a pena pagar um pouco mais e ir pra outra cabine. A essa altura a
diferença de preço já não é mais tão grande assim, já que todas as cabines
estão em guerra para atrair clientes.
Enfim, esse
é um cenário que não acontece. Não acontece por que todas as cabines pertencem
a uma mesma empresa; empresa esta que ganhou alguma licitação lá atrás e por
isso o governo se assegura de que nenhuma outra concorrente vai poder explorar
aquela estrada pelo tempo da concessão.
A mão do governo também aparece em uma série de licenças e certificações que são exigidas para atuar em determinadas indústrias. Como a obtenção dessas permissões gastam tempo e dinheiro, a barreira para novos entrantes aumenta.
2. PATENTES
As patentes
são barreiras legais que bloqueiam a participação da concorrência. Muito comum
nas indústrias farmacêutica e de tecnologia, a patente garante à empresa exclusividade na
exploração de um produto ou idéia por um determinado tempo.
Existe uma velha crítica social envolvendo as patentes. O que se argumenta é que elas evitam a concorrência e, consequentemente, evitam também preços mais baratos para os consumidores em produtos essenciais. Ainda que tenha algum mérito, a verdade é que as inovações sequer chegariam ao mercado sem as patentes. Isso por que elas permitem que o inovador ganhe um retorno adequado sobre o capital investido em pesquisa e desenvolvimento. Sem as patentes, as empresas não teriam incentivos para inovar.
3. NETWORK EFFECTS
Ou efeitos
de rede. É um dos meus favoritos! O efeito de rede existe quando o valor do serviço/produto cresce a medida que mais pessoas utilizam o serviço/produto. É o caso de empresas como
Visa, Uber, iFood e Facebook.
A beleza do
efeito de rede é que cada novo nó faz com que o número de potenciais conexões na
rede cresça exponencialmente. Uma vez alcançada a massa crítica, o crescimento
de uma empresa que conta com efeito de rede é vertiginoso, tornando-a dominante em sua indústria.
O efeito de
rede é uma fonte de moat por que uma empresa concorrente, com suas poucas conexões,
não consegue gerar o mesmo valor para quem usa. E como já existe
alternativa, fica mais difícil para essa concorrente atrair clientes ou
usuários. Pense no seguinte: você acha que seria fácil atrair um usuário do
Instagram para a sua recém-criada e desconhecida rede social de postagem de
fotos?
4. CUSTO
A vantagem
de custo é uma das fontes de moat mais comum. Significa ter a capacidade de operar
a um menor custo de forma a poder vender a preços mais baixos do que os
concorrentes e, assim, eliminar a competição.
Vantagens
de custo podem vir desde eficiências operacionais até economias de escala. Na
crônica sobre o Sam Walton eu falei sobre como o Walmart avançou nas pequenas
cidades americanas até eventualmente atingir os grandes centros. O alto número
de lojas e vasta rede de distribuição deram grande poder de barganha para o
Walmart negociar com fornecedores e repassar os descontos para seus clientes. Não
foi a toa que, sem poder competir em preço, muitos varejistas menores acabaram
quebrando nas cidades onde o Walmart chegou.
5. MARCAS
“nós nunca
vamos criar alguma coisa valendo 2 trilhões de dólares a partir da venda de uma
bebida genérica. Sendo assim, nós temos que fazer do seu nome, “Coca-Cola”, uma
marca forte e legalmente protegida.” – Charlie Munger
Marca é uma
outra fonte de moat que explorei em post anterior, dessa vez quando falei sobre
a Disney. Quem nunca esteve em dúvidas na hora da compra e acabou escolhendo um
produto apenas por que era de uma marca conhecida?
Um dos
investimentos mais icônicos de Buffett e Munger foi a See's Candies. A See's
Candies é uma famosa marca de chocolates americana, uma espécie de Kopenhagen
da Califórnia. Segundo Buffett, na Califórnia todo mundo tem alguma lembrança
especial sobre a See's Candies. Então não é surpresa que quando chega uma data como o Dia dos
Namorados ninguém deixa de comprar uma caixa da See's Candies para comprar o
chocolate de uma marca genérica.
É
importante que o investidor não caia na armadilha de achar que basta uma marca ser
famosa para ela ser um moat. Ser conhecida é uma condição necessária porém não
suficiente para uma marca ser um moat. É preciso que a marca tenha força para
afetar o comportamento do consumidor, tornando-o um cliente cativo ou um
cliente que esteja disposto a pagar mais pela marca. Sem isso, não há um moat em
torno da marca.
6. SWITCHING COSTS
Outro dos
meus favoritos! É quando o custo de trocar de produto excede o valor que o consumidor
vai receber ao efetuar a troca. O switching cost pode ser financeiro - como uma
multa em caso de quebra de contrato - mas nem sempre é assim. As vezes o
switching cost pode estar relacionado ao esforço que o cliente terá que fazer
para trocar de produto. Exemplo? Software corporativo!
Pense num empresário
que possui várias lojas de material de construção. Ele utiliza um sistema que o
ajuda a controlar o seu estoque e fluxo de caixa. O sistema ainda emite nota
fiscal e se comunica direto com o contador. Além disso ele gera automaticamente
relatórios que ajudam o empresário nas tomadas de decisão e que alertam para riscos
no negócio. O software pode não ser perfeito mas é bom o suficiente e custa
apenas 200 reais por mês. Além disso o empresário e os funcionários já estão
acostumados com a usabilidade e já tiveram o trabalho de cadastrar os centenas
de clientes e produtos no sistema.
Como você
convence esse empresário a usar outro sistema? Como você convence ele a trocar
e recadastrar todos os produtos e todos os clientes, reeducar todos os
funcionários para o novo sistema, se readaptar a um novo layout e criar
novamente os relatórios que ele quer? Isso sem falar nos bugs que aparecem
quando passamos a usar um software novo. Ainda que você cobre 50% a menos,
dificilmente esse empresário vai trocar de sistema. A simples idéia de passar pelo transtorno da troca já é dolorosa por si só. É por isso que uma empresa como a Linx tem uma
taxa de retenção tão alta.
Para poder
identificar o switching cost é importante ter um bom entendimento da
experiência do cliente, o que pode ser difícil quando se está de fora. Por isso o investidor deve sempre procurar ser cliente daquela empresa que está sendo avaliada ou, caso não seja possível, se conectar com um bom número de clientes.
O PREÇO DA RENTABILIDADE É A ETERNA VIGILÂNCIA
É possível –
e preferível - que uma empresa tenha mais de um moat. A Coca-Cola tem não só
uma marca forte como também economia de escala a partir de uma ampla rede de engarrafadores. Além disso, a Coca-Cola também
possui fórmula proprietária. Uma empresa que apresenta uma combinação de moats
tem proteções extras no seu negócio.
Antes de
finalizar esse post, é importante deixar claro uma coisa: um moat não é uma
armadura de invencibilidade! A Sears já representou 1% de todo o PIB dos Estados
Unidos, a Kodak era uma marca reconhecida e o Orkut tinha efeito de rede. Todos
eles evaporaram.
Isso
acontece por que um moat pode se expandir ou encolher ao longo do tempo. Por
isso é importante que o investidor afaste a complacência e esteja constantemente reavaliando as empresas. É importante que o investidor
reavalie se o moat está se deteriorando ou se fortalecendo. Uma dica? Observe o
pricing power da empresa. Ou seja, a capacidade que a empresa tem de aumentar
preços sem perder clientes. Uma empresa com muito pricing power é uma empresa
que tem um moat.
Mais pra
frente pretendo entrar em mais detalhes sobre como medir moats mas, por
enquanto, é só.
Stay cool,
Don Black