Uma história que me aconteceu há alguns anos foi com o
Oliveira e a Joana minha cunhada. Todos nomes fictícios, claro.
A minha cunhada é dessas que se diz por aí que tem azar no
amor. A pobrezinha não tem culpa. Ela se apaixona por alguns indivíduos de primeira
linha, desses que eu adoraria ter como genro. Mas quando é esse o caso, o
sujeito a ignora. É de dar pena.
De maneira que sobram os de qualidade duvidosa. Esses chovem
as pencas no colo da Joana. As vezes é a vez dela de ignorar. Mas as vezes ela
dá uma chance para o Romeu e segue em frente. O Romeu da historia é o Oliveira.
***
O caso do Oliveira
com a Joana parecia o plano de metas do Kubitschek. Voltamos para Londres no
fim de Agosto e até então o sujeito ainda nem existia. Quando foi fim de
Outubro ouvimos falar que a Joana planejava se casar com um tal de Oliveira.
Era a primeira vez em muito tempo que a Joana falava em casamento então minha
esposa achou por bem quebrar o protocolo e ir de novo para o Brasil em Dezembro, antes do Natal. E
assim foi feito.
Assim que chegamos no Brasil a Joana foi logo nos visitar.
Sozinha. Disse que o Oliveira estava animado para conhecer a gente e por isso
nos convidou para jantar. Naquela mesma noite. Eu queria mesmo era postegar. Esse negócio de jet lag sempre mexeu com a minha cabeça. Mas como a coisa toda já estava até reservada eu deixei como estava. Ajudou que
o restaurante que o Oliveira escolheu era um dos meus preferidos. Um acaso da natureza.
A verdade é que a noite foi mesmo muito agradável. O Oliveira era
um camarada muito divertido, nascido e criado no mesmo bairro que eu. Alguns
lugares e histórias em comum. Chegou a pagar a conta toda. Em dinheiro, claro. A minha esposa e a irmã dela também estavam animadas. Então quando tudo terminou e finalmente entrei no carro, minha esposa logo se
adiantou:
“Caramba, dessa vez a Joana acertou. O Oliveira é ótimo! O
que você achou?”
“Achei ele um tremendo charlatão.”
“O quê!? Mas ele parecia seu melhor amigo!”, protestou
“Claro, charlatões sempre são agradáveis. É o trabalho
deles. Do contrário estariam morendo de fome.”
“Aff, pois eu gostei dele!”
“Exatamente!”
E não se falou mais do Oliveira.
***
Quando fomos visitar meus sogros eu notei que o Oliveira já
era mais popular que os Beatles dos anos 60. E você sabe o que Lennon disse
sobre a popularidade dos Beatles dos anos 60. Enfim, em 2 minutos da nossa
chegada e a minha sogra já estava se derretendo de elogios pelo Oliveira. Nada
que me surpreendesse. No afã de casar a caçula minha sogra já tinha iniciado
uns 5 enxovais para diferentes namoricos da Joana. O que me assustou foi quando meu
sogro disse:
“É um rapaz sólido!”
Um rapaz sólido! Meu sogro é daqueles que acha que o mundo é dividido entre
ele e os idiotas então quando ele diz que alguém é sólido é de se espantar. Eu mesmo nunca fui sólido. Anos de
casamento, dois filhos, vida familiar estabelecida e nunca meu sogro viu um
pingo de solidez. A coisa era grave.
Resolvi fazer o teste final. O teste absoluto para um pretendente são as
amigas de infância da Joana. É como se fossem os chefões dos joguinhos infantis. A Joana basicamente tem três grandes amigas de
vida, as quais me refiro – com carinho e em segredo – de S&P, Fitch e Moody's.
Elas são implacáveis. Em todo esse tempo elas nunca aprovaram em unanimidade um pretendente da Joana. Até o Oliveira chegar. Sim, o Oliveira era um unânime Aaa.
“Bom, talvez eu esteja errado.”, pensei
E deixei o Oliveira pra lá.
***
No fim de semana seguinte minha sogra fez seu tradicional
cozido. É uma coisa maravilhosa. A missão na Terra da minha sogra parecia ter
sido a de alimentar a humanidade. E seguindo seu chamado ela fez um cozido que
em condições normais serviria todo o quarteirão. Mas não existia condições
normais com o Oliveira por perto. Pode-se dizer que o rapaz se sobressaia. Com
quase 2 metros de altura e branco feito um polaco o Oliveira parecia um urso
polar andando pela casa. E também comia como um urso recém-saido da
hibernação. Para tornar a cena toda ainda mais caricaturada o Oliveira andava com uma maleta para cima e para baixo.
“Quem diabos anda com uma maleta em um cozido familiar de
fim de semana?”, era tudo o que eu podia pensar.
Minha cautela venceu minha
curiosidade e quando o Oliveira veio puxar assunto em ignorei a maleta por completo.
Em vão. Ele abriu a maleta e foi logo se adiantando…
“Olha Don estou trabalhando em um projeto que vai explodir. A sua esposa chegou a comentar contigo?” - foi falando e tirando um
calhamaço de dentro da maleta.
Eu olhei para a cara da minha esposa e ela estava
cochichando com a irmã dela. As duas olhando pra gente. E tudo o que eu queria era comer meu cozido...
Bom, fato é que o Oliveira tinha ali na maleta um business
plan, cartas de recomendação e sei lá o que mais. Foi inusitado que o Oliveira
tivesse feito isso em uma reunião familiar mas confesso que não me incomodou. Esse tipo de
situação não é incomum então eu procedi como de costume: não li nada,
pedi para ele me explicar o negócio, dei as minhas razões para não querer
participar e pronto. O Oliveira entendeu, guardou tudo e continuamos falando
sobre outras coisas. Vida que segue.
Ou assim eu pensava. A coisa toda escalou bem rápido na
semana seguinte. A minha sogra se queixou com minha esposa. A Joana se queixou
com a minha esposa. A Joana até apareceu lá em casa um pouco abalada para tirar
satisfações comigo. Comigo! Queria saber por que eu não queria ajudar o Oliveira,
disse que eu estava com ciúmes, que aquela ajuda era tudo o que o Oliveira
precisava para deslanchar e eles marcarem o tão sonhado casamento. Imagine, esse drama todo.
A questão com meu sogro era mais preocupante porque ele não
é de reclamar e nem de pedir. Pelo visto ele estava providenciando meios de
ajudar ele mesmo o Oliveira. Pelas minhas estimativas era boa a chance de que
meu sogro estava prestes a fazer uma tremenda burrada. Então achei melhor
chamar logo o Oliveira para conversar. Negociei o montante que adiantaria para ele (uma fração do que ele queria) e
coloquei algumas contingências para chegar no valor cheio. Coisa de praxe. Ele
ficou satisfeito, disse que eu não ia me arrepender, que coisas incríveis
viriam pela frente e tudo mais. Já dizia Pierre Corneille que o mentiroso é sempre pródigo em juramentos.
No final das contas o negócio não deu em nada. Mas de uma
coisa o Oliveira não se enganou: coisas incríveis vieram pela frente.
Um mês
depois de eu ter feito a transferência o Oliveira terminou com a Joana. E só
demorou um mês porque o meu sogro só transferiu o dinheiro dele para o Oliveira
quinze dias depois de mim. Isso mesmo que vocês leram: meu sogro transferiu a diferença entre o
que o Oliveira “precisava” e o que eu adiantei. E então aconteceu com a gente - meu sogro e eu - o que
acontece com todo mundo que dá dinheiro para o charlatão da família: perdemos tudo.
Por conta do rompimento a Joana passou uns 6 meses
deprimida. Suas três amigas pareciam ter combinado o discurso de defesa sobre o crasso erro de julgamento:
“Mas as outras duas também gostaram dele!”
E já estavam de volta à
ativa, “avaliando” novos partidos para a Joana.
Minha sogra ficou triste pela filha e com raiva do marido.
Diz ela que meu sogro foi avisado de que eu havia dado o dinheiro para o
Oliveira e que então ele não precisava mais se preocupar em ajudar o genro. A
resposta dele? Pasmem!
“Pois se o Don acha que vai ganhar dinheiro nessa sozinho ele está muito enganado!”
Enquanto tudo o que eu estava tentando era PERDER dinheiro sozinho...
“Pois se o Don acha que vai ganhar dinheiro nessa sozinho ele está muito enganado!”
Enquanto tudo o que eu estava tentando era PERDER dinheiro sozinho...
E o Don? Bom, eu fiquei como Druckenmiller quando disse que
não aprendeu nada.
Várias lições no caso todo mas nada que eu já não soubesse. E mesmo assim eu fiquei assistindo as coisas acontecerem.
***
- Charlatões são sedutores e os melhores tem um magnetismo especial.
Não é a toa que tanta gente gosta deles.
- Charlatões tem métodos pouco ortodoxos para alcançarem o
que querem. Se eles tiverem que colocar seus adoradores para te pressionar,
eles colocarão.
- Quando a esmola é demais, desconfie.
- Se você tem e não dá, é um canalha. Se você deu e perdeu,
azar o seu.
- Opinadores opinam. Se hoje eles erram, amanhã eles voltam
a opinar como se nada tivesse acontecido. E ainda assim serão levados a sérios por muitos.
- Errar em conjunto é leve
- Tudo bem aceitar uma perda por um bem maior mas tente sempre reduzi-la ao máximo
- De onde você menos espera é que não sai nada mesmo.
- Não siga cegamente alguém só porque você o considera um
especialista. Você pode saber o que ele fez, mas não sabe nem a razão, nem a
condição e nem o contexto.
- Quando alguém está determinado a se arrebentar, não há o que você possa fazer.
- Quando alguém está determinado a se arrebentar, não há o que você possa fazer.
Entre tantas coisas mais.
Enfim, como eu disse, nenhuma novidade.
Stay cool,
Don Black
No comments:
Post a Comment