Já notei que ninguém é
indiferente à Magazine Luiza. Também pudera, é uma empresa cuja ação saiu de 1
real para 200 reais em menos de cinco anos. Quando uma valorização dessas
acontece, você pode ter certeza que existirão os haters e os fãs. De um lado,
aquele sujeito que fez carreira no lombo da empresa e já não vê cenário onde
ela pode ser vencida. Do outro lado, aquele que de tanto ver suas previsões apocalípticas falharem se tornou tão rancoroso que
passou a odiar a empresa justamente pelo que ela devia ser admirada: seu
sucesso. Entre um extremo e outro, uma
legião de opinadores. Resolvi me juntar à essa legião e gastar uns minutos pra conhecer a
empresa. Começando do começo: que empresa é essa?
A MAGAZINE LUIZA
Quando
entrei no site da Magalu, a primeira coisa que li foi:
“Uma
plataforma digital, com pontos físicos e calor humano.” Este é o Magazine
Luiza. Uma empresa brasileira, que desenvolve tecnologia e que tem o varejo na
alma.
Plataforma
digital? Desenvolve tecnologia? Estou lendo sobre a Amazon ou sobre a Magazine
Luiza??? Resolvi dar
uma olhada no prospecto do IPO e vi que, em 2011, a Magazine Luiza era apenas “uma
das maiores redes varejistas com foco em bens duráveis com grande presença nas classes
populares do Brasil.” Nada de tecnologia em 2011. Em 2011...
Deixando
toda essa evolução histórica de lado por enquanto, o que eu aprendi é o
seguinte:
A Magazine
Luiza é uma varejista brasileira com 954 lojas físicas e 12 centros de
distribuição localizados nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste do
país. A empresa vende tanto através das suas lojas físicas como por seus canais
eletrônicos, onde há integração omnichannel e também um marketplace para venda
de terceiros.
Se você
achou a descrição muito parecida com a da Centauro do outro post, é porque ela
é mesmo. A diferença é que a Magazine Luiza, além de comercializar artigos
esportivos através da recente aquisição da Netshoes, comercializa também
eletrodomésticos, eletrônicos e móveis. Mas não se iludam achando que é tudo igual: tanto o Guardiola
quanto o Celso Roth, quando perguntados, respondem que são
técnicos de futebol.
A MAGAZINE
LUIZA AO LONGO DOS ANOS
De 2011 até
2014 a Magazine Luiza não impressinou muito. Buscou um crescimento no Nordeste,
comprou as Lojas Maia e as Lojas do Baú - quem resiste a tentação de sair às compras com
dinheiro de IPO? – e passou cinco anos com indigestão para absorver isso tudo.
Foi um período de aumento do endividamento, margens medíocres e, o mais
importante, sem geração de caixa. Eu sempre sou cauteloso com empresas que não
geram caixa. Existem milhares de racionalizações para comprar uma empresa que
queima caixa mas a verdade é que caixa é o oxigênio de qualquer negócio. Ainda que seja lucrativo, um negócio morre sem caixa. Qualquer microempreendedor sabe disso e no
entanto muitos investidores ignoram. Enfim, fato é que a Magalu buscou conforto
no crescimento das receitas, o que pra mim não diz muito. E, pelo visto, pro
mercado também não disse: as ações caíram de R$ 16 pra R$ 7 no período.
Eu ia
incluir o ano de 2015 no período acima porque, simplesmente, ele merecia: os
números continuavam ruins com o agravante de que dessa vez a empresa vendeu
menos e deu prejuízo. Mas dois eventos me chamaram atenção: a melhora considerável na geração de
caixa e a troca no comando da companhia.
2015 foi o
último ano do Marcelo Silva tocando a empresa e, a partir dali, o bastão passou
para Frederico Trajano. Fred é da família fundadora, o que para muitos já faz
torcer o nariz. Eu não ligo. Muitas vezes os herdeiros tem uma conexão e um
entendimento melhor do negócio. Mais importante é que o Fred cresceu dentro da
empresa e não era nenhum outsider high-profile chegando para salvar a
companhia, o que aí sim seria um red flag pra mim.
Voltando ao
Fred, achei que seria boa idéia ver o call do resultado anual da Magalu de
2015. Já que o call foi em março de 2016, minha expectativa era ver um Fred participativo.
O call em si foi muito instrutivo e reforçou pontos importantes:
- Maior preocupação com redução de custos, traduzida
na contratação da Galeazzi
- Preocupação com geração de caixa,
onde o Fred explicitamente diz que “como dizem os americanos, cash is king”
- Visão da empresa para o futuro com
foco em digitalização. Iniciativas no setor já em andamento como criação da
Luizalabs, marketplace via Época Cosméticos e lançamento do app. Essa visão foi
citada como uma das razões de dar o comando para o Fred, que já liderava
com sucesso o e-commerce da companhia
- Defesa de que não é preciso abrir
mão de margens para ganhar share, no online ou no offline
Eu acredito
que esse é o call onde o investidor diligente teria sua atenção direcionada
para a Magazine Luiza. É claro que é muito fácil falar isso agora, já sabendo
os retornos do papel. Mas deixando isso de lado, reparem que os grandes sinais
foram dados nesse call: caixa, margem, share, gestor e visão. A questão não é
que o investidor tinha que ter comprado o papel nesse momento, mas é a partir desse
momento que ele deveria passar a acompanhar a empresa com uma lupa.
A partir
daí tudo é história: a visão digital da Magalu foi se concretizando, as vendas
online explodiram, a geração de caixa se manteve saudável, o endividamento
diminuiu, as margens também explodiram, o retorno sobre o capital investido
ficou cada vez melhor e a empresa não saiu do topo das maiores valorizações anuais
do Ibovespa.
Essa é uma
transformação que só foi possível pelos méritos da equipe de gestão liderada
pelo Frederico Trajano. Eu tendo a dar muita importância à gestão mas reconheço
que em algumas situações ela não é tão determinante. Varejo não é uma delas.
Ter uma boa varejista com um operador ruim é como ter uma cobertura na Trump
Tower e não ter elevador. A empresa de varejo precisa de um grande operador, e
o fato de que o período do Fred à frente da Magalu coincidiu com um apagão na
gestão de outras varejistas criou um efeito exponencial raro de se presenciar.
Mas e a
partir de agora?
A MAGAZINE
LUIZA E O FUTURO
A Magazine
em si tem sua visão de futuro traçada: ela quer ser uma Amazon do Brasil.
Simplificado, claro! Ela quer ter uma vasta oferta de produtos (próprios e terceiros)
nos seus canais e que esses produtos cheguem o quanto antes na casa do
consumidor. A partir daí, ela quer se inserir na vida e na rotina do consumidor, a parte mais difícil e mais valiosa. Pra isso ela vai seguir investindo
em logística e entrega, assegurar mais produtos ofertados (daí a compra da
Netshoes) e trabalhar seu marketplace.
Tudo muito
louvável. Quem não quer ser a Amazon do Brasil? Até a Amazon quer! Mas não é
fácil. Até esse momento, a Magalu não oferece nenhum valor insubstituível para
os consumidores. A Magazine sequer está inserida na vida dos consumidores como
está o MercadoLivre, por exemplo. Todo esse papo de multicanal, comprar e
retirar na loja, venda online, marketplace, blablablá, está comoditizado. Nada disso,
por si só, é diferencial. Qualquer um consegue criar um marketplace na garagem
de casa mas isso não quer dizer que vá conseguir brigar com o MercadoLivre.
Parte do
sucesso da Magazine vem da inércia dos concorrentes, o que não é um fator para
se apoiar. No momento em que os concorrentes despertarem, se a Magalu ainda não
tiver uma proposta de valor superior, vai começar a guerra do varejo. E a
guerra do varejo vai ensinar pro Fred que, diferentemente do que ele imaginou no call de 2015, é
preciso abrir mão de margens. E essa é a corrida que a Magazine Luiza está
travando.
VALUATION
Pra
começar, eu jamais shortearia MGLU3. Nenhuma novidade, já que eu não shorteio
nada. Mas em se tratando de uma empresa bem gerida, com visão de crescimento,
com concorrência moribunda e com a simpatia do mercado, shortear passa a ser
especialmente uma má idéia. Ainda que o investidor esteja certo no conceito,
ele pode quebrar bem antes que sua tese se concretize.
Sobre o
Valuation em si, o importante não são os números mas a estória que você dá aos
números. Se você acredita na estória de que a Magalu vai conseguir entregar sua
visão antes que as concorrentes acordem pra vida, eu diria que R$ 240 é um
preço conservador. A Magalu, entregando sua visão, deixa de ser uma simples
varejista e passa a ser uma growth stock onde o céu é o limite. Se você acha
que a Magalu vai seguir sendo “apenas” uma boa varejista no meio de um bando de
cegos, então eu diria que ela está no seu preço justo. Mas se você acha que a
Magalu vai deixar de entregar ou que a concorrência vai acordar, então a
empresa certamente está cara.
Seja qual for a estória que você quer dar, uma coisa é inegável: a Magazine Luiza vem cumprindo seu plano desde que o Frederico Trajano assumiu as rédeas da companhia.
Stay cool,
Don Black